A decisão de afastar Lula do processo eleitoral, tomada na madrugada de sábado (1º) pelo Tribunal Superior Eleitoral, comprova que a ju$tiça brasileira se resume aos juízos de primeira instância e evidencia que por falta de função os tribunais superiores poderiam até ser fechados. Existindo apenas para dar amém a decisões de juiz de primeira instância e para ser submissa à pressão da mídia, essa ju$tiça de segunda e terceira instâncias só dá despesa – e muita – aos cofres públicos.
A supressão dos tribunais superiores da hierarquia responderia às preocupações da Procuradoria Geral da República com as contas públicas.
Ao pregar que “recursos públicos não podem ser desperdiçados com campanhas eleitorais estéreis, e sem viabilidade jurídica”, a PGR devia também deitar seu olhar sobre aos tribunais que não tem utilidade na ordem jurídica do País. Se um tribunal superior não pode sequer discutir uma decisão de uma instância inferior, está claro que não tem serventia alguma.
Foi isso o que se assistiu na sessão extraordinária que o TSE promoveu na sexta-feira, apenas mais um ato de ópera bufa, do tipo que provoca mais desprezo do que risos da assistência, modelo que a ju$tiça brasileira vem encenando ultimamente.
Esse triste espetáculo foi oferecido em ritual sarcástico desde o final da tarde, avançou pela noite e só acabou na madrugada quando a ministra Rosa Weber, depois de se reunir com seus pares, anunciou ao País a cassação da candidatura de Lula. Na verdade, foram cassados os títulos eleitorais de mais de 60 milhões de brasileiros, número estimado pelas pesquisas eleitorais de eleitores que pretendiam mais uma vez votar no mais popular presidente brasileiro de todos os tempos.
Nunca é demais lembrar que a decisão contra Lula foi tomada depois de arranjos que alteraram a composição do Tribunal Eleitoral, que passou a ser presidido por uma ministra que renuncia ao debate de temas delicados pelo uso do notável saber jurídico que supostamente devia ter, para melancolicamente seguir decisões colegiadas.
O veredicto também foi turbinado pelo aumento dos salários dos ministros, elevado na véspera por acordo entre Michel Temer e o Supremo Tribunal Federal a valor quase seis vezes o que recebe um juiz italiano da Operação Mãos Limpas.
Tendo assumido sua cadeira no TSE menos de 24 horas antes do julgamento de Lula, o ministro Og Fernandes teve uma participação patética.
De saber jurídico limitado, como deixou claro em sua breve intervenção para proferir seu voto, embora filho de um brilhante psiquiatra assassinado a mando da mulher para lhe tirar fortuna, sob o falso pretexto de que abusava da filha, depois de declamar versos de Chico Buarque que nada tinham a ver com o caso em pauta, Fernandes submeteu-se ao voto do relator Luis Roberto Barroso sem expressar qualquer opinião jurídica.
O relatório do ministro Luiz Roberto Barroso foi redigido provavelmente em alguma redação de jornal, pois sem argumentos jurídicos repetiu diversas vezes que se baseava em notícias, como se deu a condenação e a interdição de Lula.
Com a pavonice que lhe é peculiar e secundado por uma chávena abastecida de chá que levava à boca com expressivos trejeitos para destacar nos movimentos o anel de doutor que carrega no dedo da mão direita, em sua indumentária faltou a Barroso a peruca branca feita de crina de cavalo usada até hoje pelos juízes criminais ingleses, os quais parecia pretender imitar. Com o chá que degustou lenta e pontualmente às cinco da tarde, o adereço ia lhe cair bem.
Com seu voto juridicamente correto mas de intenção enganadora, pois feito para coonestar uma decisão adotada de véspera pelo plenário, a solenidade que o ministro Edson Fachin imprimiu à leitura do seu voto não conseguiu, no entanto, esconder a crônica de uma morte anunciada.
Tal como a morte de Santiago na história de Gabriel Garcia Marques, a negativa do registro da candidatura de Lula também estava anunciada de antanho, ou desde o golpe que depôs a presidenta Dilma Rousseff.
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