Para se reafirmar como possível candidato da direita radical à eleição presidencial de 2026, posto vago após Jair Bolsonaro (PL) ser declarado inelegível pelo TSE devido à micareta golpista com embaixadores, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), resolveu apelar ao preconceito regional, tentando jogar o Sul e Sudeste contra o resto do país.
Declarações dadas por ele durante entrevista a Monica Gugliano e Andreza Matais, do jornal O Estado de S.Paulo, neste sábado (5), geraram indignação entre políticos e figuras públicas, da direita liberal à esquerda. Mas excitaram o rebanho bolsonarista nas redes sociais, principalmente aqueles com tendências xenófobas, racistas e separatistas.
Dando respostas do tipo “nós contra eles” ao tratar da tramitação do projeto de Reforma Tributária, Zema defende que o Sudeste e o Sul precisam ir além do protagonismo econômico e garantir também o protagonismo político sobre o restante do país. O respeito ao federalismo? Que se exploda.
E desceu fundo ao comparar o Nordeste, o Centro-Oeste e o Norte com “vaquinhas que produzem pouco”, mas recebem “tratamento bom”, enquanto o Sul e o Sudeste são as que “produzem muito” e não teriam o mesmo tratamento.
Zema investe na antiga estratégia da extrema direita da parte mais rica do país de culpar a mais pobres por seus problemas. Essa narrativa não fica apenas na bizarra acusação de que a outra parte “não sabe votar”, mas repete que ela fica com recursos arrecadados pelos estados mais ricos. Esse discurso ignora, por exemplo, que boa parte das matérias-primas que chegam no Sul e Sudeste é produzido no Nordeste, no Norte e no Centro-Oeste, ao custo de destruição ambiental e superexploração do trabalho.
Não raro, o ônus fica com a Amazônia e o Cerrado e o bônus com o Sul Maravilha.
É um absurdo, mas gera identificação com uma parcela radical do eleitorado de Jair. E é isso o que o governador quer: mostrar que pode ser uma liderança nacional e, lá na frente, disputar o espólio eleitoral deixado pelo ex-presidente e sua apadrinhamento.
Uma coisa é um consórcio de Estado defenderes seus interesses, outra é defender ações do Sul e do Sudeste contra o Nordeste e outras regiões. Isso não é apenas alimentar o radicalismo violento que o Brasil está tentando desmontar após a eleição. É também tosco do ponto de vista eleitoral.
Até Bolsonaro entendeu, em determinado momento, que não se ganha vencendo apenas no Sul e Sudeste. E esse tipo de preconceito, se excita uma camada extremista da população, provoca ojeriza em outra. Jair venceu Lula no Estado de São Paulo, mas na capital paulista, uma das cidades mais nordestinas do país, foi o petista que ganhou por 54% a 46%.
Ironicamente, dos sete estados do Sul e Sudeste, Bolsonaro perdeu em apenas um: exatamente as Minas Gerais de Romeu Zema. O resultado foi apertado, 50,20% a 49,80%, mantendo o padrão de termômetro do humor nacional – quem vence lá vence também no resto do país.
A estratégia de Zema é arriscada, principalmente em um momento em que a maioria da população se mostra cansada do choque-doideira dos últimos quatro anos, que culminou em uma tentativa de golpe de Estado. Apesar de alegrar os extremistas nas redes, o figurino que o governador quer vestir pode ser que não combine com o baile que o país está preparando para daqui a três anos.
Em tese, o herdeiro natural da vaga deixada por Bolsonaro na eleição seria o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Se a economia estiver bem, com renda e emprego em alta, ele vai preferir disputar a reeleição ao Palácio dos Bandeirantes do que enfrentar Lula ou alguém por ele ungido. Nesse caso, abre espaço para um nome, como Zema. Mas aí, o mineiro de Araxá, muito provavelmente, perderia a eleição para o tal “protagonismo econômico”.
Publicado originalmente no UOL