O empresário Meyer Nigri compartilhava mensagens golpistas que recebia de Bolsonaro. Já disse publicamente que nem sabia direito o que passava adiante. E acha que foi usado.
O empresário Luciano Hang era o mais intenso ativista bolsonarista no meio empresarial. No dia 11 de janeiro, três dias depois da invasão de Brasília, gravou um vídeo combatendo o ódio e a violência e pregando a paz.
Pelo tom do vídeo, sugeriu que estava dando adeus à essência do bolsonarismo e anunciou que passava a ser passageiro comportado do avião pilotado por Lula. Isso mais de dois meses depois da eleição.
Hoje, Nigri e Hang são os dois últimos passageiros do inquérito de tios ricos do zap, conduzido por Alexandre de Moraes. São investigados por suspeita de golpismo e ataques às instituições.
Eram de um grupo de oito tios, todos milionários. Seis foram liberados. Moraes reteve os dois que ainda exigem outras investigações e porque existem mais indícios de delitos contra eles.
O que ambos continuam tendo em comum é que, cada um a seu modo, se declaram desistentes do bolsonarismo. Um dizendo que foi usado e o outro informando que largou a militância de extrema direita.
Agora as discordâncias entre ambos. Quando os oito foram enquadrados por Moraes, em agosto do ano passado, todos se encolheram.
Menos o véio da Havan, que esteve, sempre efusivo e vestido de verde-amarelo, ao lado do seu líder ou agora ex-líder nos festejos do 7 de setembro em Brasília. Os outros desapareceram e se calaram.
Mas Nigri entregou o celular e a senha à Polícia Federal, e Hang se nega a fazer o mesmo. Entregou o celular, mas sem fornecer a senha.
Na resposta a uma mensagem golpista de Bolsonaro, que recebeu em junho do ano passado, Nigri disse que já tinha feito o compartilhamento do texto.
Em entrevista ao Estadão, assegurou que fazia compartilhamentos no automático, que não era amigo de Bolsonaro e que o inelegível fora uma única vez à sua casa, quando o empresário se recuperava da Covid.
Mas na resposta à mesma mensagem, lamentou: fazia tempo que não se falavam. E mandou um abraço desde Veneza.
Já Luciano Hang não tem falado mais nada desde que virou passageiro de Lula. Mas tem a espada da investigação e do celular bloqueado dependurada sob sua cabeça.
Nigri foi definido pelo seu sucessor como CEO na Tecnisa, Fernando Perez, como alguém que entrou de gaiato (ele usa essa palavra) no grupo dos oito tios do zap.
E como gaiato é que foi usado? Por quem, por Bolsonaro ou pelos outros tios empresários? A entrevista não esclarece.
É complicada a situação dos dois, por causa das circunstâncias, do contexto e do perfil de ambos.
Discute-se hoje se os manezinhos e terroristas presos nos dias 8 e 9 de janeiro devem ficar livres de condenação e da cadeia.
Debate-se, desde a prisão dos manés, por que só eles foram encarcerados entre golpistas civis. E cresce ao mesmo tempo o temor de acordões com o golpismo graúdo fardado e sem farda.
O Supremo trouxe até aqui, durante um ano, o inquérito em que os dois são os últimos grandões investigados. Não há nenhum golpista com poder econômico enquadrado até agora.
Setores à direita e à esquerda lamentam que o sistema de Justiça só tenha transformado manezinhos em réus.
O cenário e o conjunto de fatores desfavorecem os dois milionários. Não há mais ninguém com o porte econômico de ambos sob os cuidados de Moraes, que deseja saber das ligações mais profundas deles com Bolsonaro.
Antes de saírem desse purgatório, se é que sairão, ambos passarão por muitas provações. A pergunta é esta: a velhinha de Tubarão pode ser condenada, e o véio da Havan pode escapar?
Texto originalmente publicado no Blog do Moisés Mendes.