“Povo palestino tem direito a resistir e é um equívoco o carimbo de terrorista”, diz Serrano ao DCM

Entrevista ao DCMTV

Atualizado em 12 de outubro de 2023 às 20:29
Pedro Serrano. Foto: Reprodução/DCMTV/YouTube
Pedro Serrano. Foto: Reprodução/DCMTV/YouTube

O jurista Pedro Serrano afirmou ao DCM Ao Meio-Dia que “Israel tem o dever de garantir saúde e alimentação” dos palestinos na guerra. 

“Hoje, chamar alguém de terrorista é um discurso sempre que um Estado usa em relação à sua oposição para poder desumanizar. E, com isso, poder eliminá-la”, falou.

“Nós não podemos ser inocentes nisso. O uso da palavra terrorista tem um sentido político desumanizante. Nem o terrorista que faz terrorismo de fato deveria ser desumanizado”.

Veja os principais trechos.

O dever

O dever no Direito internacional ante os direitos humanos da força ocupante é garantir a segurança da população ocupada. Por isso, Israel teria o dever de garantir a saúde, alimentação e segurança daquela população de Gaza.

Israel está fazendo exatamente o contrário. Está negando assistência médica, negando alimento. Isso é sério. Isso é grave. Porque não é algo adequado.

Não é algo aceitável numa perspectiva civilizatória. A mídia corporativa deveria, além de criticar os métodos do Hamas, também deveria fazer a crítica dessa situação de Israel.

Porque daí conseguiria um equilíbrio crítico. Seria um discurso mundial que colocaria as coisas como eles deveriam estar.

Não é o que ocorre, né?

“A postura do Lula de não ter lado é radicalmente correta”

É desumanizador isso que eu vi na Globo. É querer legitimar o massacre do povo palestino. É essa a lógica. Não dá para ter lado nesse conflito. A postura do presidente Lula está radicalmente correta.

Não ter lado é ser pela paz, e para ter paz. Infelizmente a paz do lado de alguns de Israel significa massacrar o palestino. 

É a paz da morte. A paz sem voz. Esse tipo de paz que você tá tratando não é a paz que nós queremos.

Nós queremos uma paz que não tenha genocídio.

Com dois povos que possam conviver.

“Cerco em Gaza pode ser o maior genocídio à luz do dia”

Na Escola Ibérica da Paz, quando se pensou os direitos na época, era uma forma muito primitiva de pensar os direitos. Era uma forma teológica que se imaginava os direitos como advindos do fato de sermos filhos de Deus. Isso nos levaria a termos direitos naturais e a natureza humana seria o fato de sermos filhos de Deus.

Tanto na Escola Ibérica da Paz quanto os huguenotes franceses que enfrentaram as perseguições religiosas dos reis absolutistas da época. Em ambos era considerado central nos direitos naturais o direito à resistência. O direito que a gente tem de resistir às tiranias. Na ditadura, a esquerda recorreu à luta armada como um direito humano a resistir.

O povo palestino está no seu legítimo direito humano a resistir. Por isso é que é um equívoco querer sair dando o carimbo de terrorismo para eles. Há um equívoco no plano do Direito internacional em fazer isso a meu ver.

O primeiro equívoco é porque não há sistema de direitos que se garanta sem reconhecimento, nem que seja implícito, do direito a resistir. O segundo elemento problemático que eu acho importante é que chamar de terrorista não é uma descritiva.

Não ajuda a descrever essas condutas, que insisto que nós não aceitamos essas condutas que o Hamas assumiu.

Nós não aceitamos. E não é a intenção desumanizar o povo palestino que habita Gaza, para irem poder massacrá-la. Infelizmente é sempre assim na modernidade: você cria uma linguagem, um nome que desumaniza aquele contingente de pessoas.

E aí você se libera para matar. É a necropolítica. Os judeus no passado foram massacrados porque eram desumanizados. Foi assim com a palavra comunista.

Hoje, chamar alguém de terrorista é um discurso sempre que um Estado usa em relação a sua oposição para poder desumanizar. E, com isso, poder eliminá-los.

Nós não podemos ser inocentes nisso. O uso da palavra terrorista tem um sentido político desumanizante. Nem o terrorista que faz terrorismo de fato deveria ser desumanizado.

Isso também não significa, por outro lado, aceitar os métodos que o Hamas utilizou nesse ato militar. Estamos falando de um uma estrutura organizada que pensa racionalmente e que hoje tem mais armas que teve no passado.

Utilizaram métodos absolutamente inaceitáveis e que a gente deve repudiar sim. Sequestrar inocentes, mantê-los em cativeiro e ameaçar matá-los?

Não conseguir determinadas coisas não torna isso um método aceitável num conflito. É um método desumanizador. É um método que trata esses reféns não como seres humanos, mas como gado que pode ser morto.

Isso não pode ser admitido. Agora, por outro lado, a ação que Israel está fazendo é inaceitável. Manter dois milhões de pessoas sem água, sem assistência médica, sem alimento.

Isso é matar de fome a população civil de dois milhões de habitantes. Vai ser o maior genocídio à luz do dia que a gente vai ter no mundo contemporâneo.

Não se pode aceitar isso. O mundo tem que reagir em relação a isso. Não se pode aceitar esse cerco desumanizante que Israel realiza.

Há o extremismo religioso do Hamas e um extremismo de direita dos provocadores de Israel.

A reação do Hamas tem legitimidade, apesar dos métodos. Então os dois lados errados. É importante se encontrar um mecanismo de paz para evitar mais mortes.

A primeira forma que a imprensa pode contribuir para isso é parar com o discurso em favor de um dos lados e fazer um discurso mais de reflexão e de paz.

Veja a entrevista na íntegra.

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