Não é só na sua bolha: é real, nunca antes tantas pessoas morreram tanto em cirurgias estéticas – como Luana Andrade, a influenciadora de 29 anos que morreu enquanto fazia uma lipoaspiração, ou ingestão de remédios para emagrecer, como Paulinha Abelha, morta no ano passado pelo uso excessivo de laxantes e inibidores de apetite.
Em outras palavras: não é coincidência que vejamos tantas mulheres mortas em busca de um padrão de beleza inalcançável.
Trata-se, pelo contrário, de um projeto de dominação feminina através dos padrões de beleza, projeto este vigente desde a Revolução Industrial, quando o mercado de trabalho passou a explorar mão de obra feminina, derrubando o que se chamava de “mito da domesticidade”, dando espaço ao que agora se chama de “mito da beleza”.
Se antes o melhor jeito de controlar as mulheres era aprisionando -as no papel de rainhas do lar, agora essa dominação é efetivada em mesas de cirurgia e clínicas de estética, sobretudo com o imperativo da magreza em um mundo dominado por alimentos ultraprocessados.
Convencer pessoas – sobretudo mulheres – de que não são bonitas o suficiente e criar padrões de beleza inexistentes fora dos filtros do Instagram é uma ótima maneira de dominá-las: estarão ocupadas se sentindo insuficientes ou sofrendo com procedimentos estéticos invasivos.
Aliás, um parêntese: você tem ideia de como uma lipoaspiração é feita?
Com mangueiras sendo enfiadas com força na barriga da paciente, para sugarem a gordura abdominal, ainda que isso signifique dores terríveis no pós – operatório.
De tão convencidas de que precisam ter um corpo que não têm, que é possível dizer que as pessoas têm arriscado as próprias vidas para encaixarem-se nesse padrão de beleza digitalmente modificado.
É nesse cenário que a procura por cirurgias estéticas tem crescido exponencialmente: 140% só no ano de 2020, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica.
Grande parte dessas cirurgias são realizadas em pessoas mais jovens, sendo mais recorrentes em mulheres.
É interessante para o sistema que as pessoas estejam infelizes, insatisfeitas com a própria aparência, porque só assim elas consumirão a infinidade de produtos e procedimentos cirúrgicos para alcançarem um padrão de beleza que simplesmente não existe, sobretudo nesses tempos em que filtros digitais escondem rostos reais.
Estamos falando, portanto, não de uma coincidência, mas de um fenômeno do qual pouco se tem falado dentro e fora da academia.
O fato é que padrões de beleza estão matando e mutilando pessoas, principalmente mulheres, vítimas não de uma fatalidade, como se poderia encarar o fato, mas de uma cultura, vítimas de um tempo.
Pra piorar, redes sociais são um veneno para a autoestima da pessoa comum: Hoje comentava com um amigo sobre as mulheres, cada vez mais jovens, – muitas vezes meninas – procuram cirurgiões plásticos buscando tornarem-se iguais em aparência com rostos modificados digitalmente, como em filtros do Instagram e TikTok, por exemplo.
Trazer para a vida real uma aparência manipulada digitalmente é um sinal mais do que claro que já algo de muito errado no nosso tempo: preferimos nossas versões inventadas do que nossas versões reais, e preferimos ao ponto de arriscarmos nossas vidas em nome disso.
Luana Andrade não é uma exceção, sua morte não é apenas uma fatalidade, é sintoma de um tempo em que as imposições estéticas são agressivas como nunca antes.
É urgente que vejamos as imposições estéticas como ferramentas de um projeto de dominação que em muito ultrapassa os limites da estética.