Além do ex-juiz Sério Moro, aguardando a guilhotina no Senado, e de Dallagnol, deputado cassado que se declara “embaixador nacional do Partido Novo”, outros ex-astros da outrora intocável Lava Jato vivem entre papéis secundários, muitos transferidos para o interior e vetados de missões importantes.
Embora a maioria siga no Ministério Público, há os que se aventuram, como Carlos Fernando dos Santos Lima, que advoga na área de compliance, Roberson Pozzobon, que dá aulas, e o bacharel do grupo no Rio, o ex-juiz Marcelo Bretas, que tem atuado como coach jurídico depois de ser afastado do cargo sob suspeita de conduta irregular.
Ex-procurador da Lava Jato agora advoga leniência
O ex-procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos mais arrogantes da equipe, virou “advogado sênior na área de compliance, investigações internas, monitoria, gestão de crises e acordos de leniência e colaboração premiada”.
Em seu perfil no LinkedIn, cita uma frase de William Shakespeare – sem perceber que serve muito bem para sua antiga equipe, que ele homenageia com uma foto e os dizeres “Os intocáveis”. A frase do bardo: “O mundo inteiro é um palco. E todos os homens e mulheres não passam de meros atores. Eles entram e saem de cena. E cada um no seu tempo representa diversos papéis.” Shakespeare sabia mesmo das coisas.
Nas redes, entre fotos em maratonas e passeios, Roberson Pozzobon, “força da natureza” na força-tarefa, dá agora aula na Faculdade Campo Real, em Guarapuava, no Paraná. Ele gravou um vídeo de apoio a Deltan Dallagnol. “Cristo, Família e Esportes” são seu lema, uma variação do “Deus, Pátria, Família”, de Bolsonaro, inspirado no movimento integralista, que surgiu no Brasil na década de 1930 e teve origem no fascismo de Benito Mussolini, na Itália.
Já Laura Gonçalves Tessler foi lotada na Procuradoria da República no Município de União da Vitória, sudeste paranaense. Foi ela a procuradora citada por Moro, num diálogo gravado, dizendo que a moça não servia para audiências. Um dos sinais de como Moro direcionava as ações da procuradoria desde o início das investigações.
A procuradora Isabel Cristina Groba Vieira atualmente está lotada na 3ª Região. Considerada arrogante, ganhou notoriedade ao interromper um depoimento para ordenar a Lula que não a chamasse de “querida”, mas de “doutora”. Um dos mais antigos da “República de Curitiba”, Januário Paludo foi outro deletado, especialmente depois que o doleiro Dario Messer, um dos investigados pela Operação Lava Jato, afirmou em conversas interceptadas pela Polícia Federal que pagou propina ao calvo procurador. Foi encostado numa unidade descentralizada da corregedoria em Curitiba.
Procuradora que debochou da morte de Marisa Letícia agora é investigada
A procuradora Jerusa Burmann Viecili, outra ex-Lava Jato, agora em Porto Alegre, que vinha investigando a Transpetro, viu tudo ir pelo ralo depois que o Supremo anulou as provas oriundas dos acordos de leniência da Odebrecht. Agora, a conduta de procuradores da República, como ela, será investigada. Jerusa Viecili ficou conhecida como uma das integrantes do MPF a ironizarem a morte da esposa de Lula, Marisa Letícia, em 2017, e os pedidos do ex-presidente para ir ao enterro de familiares que morreram naquele ano – o irmão Vavá e o neto Arthur.
“Querem que eu fique pro enterro?”, escreveu Jerusa, e colocou um emoji sorrindo logo depois de outro procurador, Julio Noronha, publicar notícia sobre a morte de Marisa. Ela compartilhou com os colegas matéria sobre a morte de Arthur e escreveu: “Preparem para a novela da ida ao velório”.
Athayde Ribeiro Costa foi apontado, junto com Dallagnol, como fabricante de delações. Ele, que era do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), foi afastado. Orlando Martello Júnior era um dos procuradores com quem Moro mais trocava mensagens informais, geralmente tratando de interesses no departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht — a área da companhia responsável pela distribuição de propina.
Martello hoje é delegado da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). O procurador Júlio Carlos Motta Noronha foi despachado pro escritório do MP em Pouso Alegre (MG). Felipe D’Elia Camargo, foi parar na Procuradoria da República no Estado de Santa Catarina.
O outdoor e o verdadeiro “intocável”
O procurador Diogo Castor De Mattos pagou por, digamos, se empolgar demais com o trabalho. A operação completava cinco anos e ele teve a brilhante ideia de, usando um laranja, contratar um outdoor com as imagens de dez procuradores integrantes da força-tarefa, no qual se lia: “Bem-vindo à República de Curitiba – terra da Operação Lava Jato. Aqui a lei se cumpre.”
A instalação foi no acesso ao Aeroporto Internacional Afonso Pena. O Conselho Nacional do Ministério Público considerou impróprio personalizar em dez “xerifes” algo que é próprio de uma instituição permanente. Diogo Castor de Mattos é irmão de Rodrigo Castor de Mattos, advogado que defendeu investigados pela Lava-ato – outro caso de conflito de interesses. No final do ano passado, surpreendentemente, a Justiça Federal no Paraná reintegrou Castor de Mattos, que, no entanto, deve ficar num expediente burocrático.
O procurador Antônio Carlos Welter virou chefe da Procuradoria Regional da República da 4ª Região, responsável por ações no TRF – nomeado pelo então procurador-geral da República, Augusto Aras. Welter foi um dos integrantes da Lava Jato responsáveis pelas investigações contra o ex-presidente Lula.
A denúncia referente ao triplex do Guarujá, por exemplo, protocolada em 14 de setembro de 2016, tem ele como um dos 13 procuradores que assinam o documento. Lula chegou a ficar 580 dias preso, após condenação em segunda instância. Mais tarde, com a mudança desse entendimento, foi solto. Logo depois, o Supremo Tribunal Federal anulou a condenação. Logo, Lula viraria presidente e a Lava Jato esse escoadouro de carreiras.