Por Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay
Como se fosse uma noite escura, dessas que tiram a luz e sufocam as esperanças e parecem não terminar nunca, a Operação Lava Jato veio para fazer política. Escolheu os alvos preferidos e protegeu outros, destruiu parte da indústria brasileira e elegeu o fascista Bolsonaro para a presidência da República. Instrumentalizou o Poder Judiciário e o Ministério Público e corrompeu o sistema de Justiça.
Ontem, a Operação fez 10 anos. Durante esse longo tempo, a chamada República de Curitiba conheceu a glória, incensada pela grande mídia e ruiu, vergonhosamente, com a exposição pública da sua podridão. Como o grupo que coordenava a farsa – Moro e seus procuradores amestrados – era composto de indigentes intelectuais, com pouquíssimo conhecimento jurídico e literário, precisava ter uma grande estrutura de marketing. Assim, passaram a acreditar que eram realmente super heróis. Nunca leram Brecht, que nos ensina que “miserável país que precisa de heróis”.
Ainda há muito o que ser desvendado e enfrentado. Os responsáveis pela Operação, que foi praticamente anulada pela Suprema Corte, têm que ser responsabilizados civil e criminalmente. A desmoralização já é importante, mas é necessário ir além. Abrir os porões da 13ª Vara de Curitiba vai fazer bem para a Democracia. O relatório que está prestes a ser publicado pelo CNJ vai jogar um pouco de luz nas falcatruas e nos crimes cometidos. Alimentar a corrupção sob o manto de combatê-la é um acinte à Democracia e ao processo penal democrático.
Para mim, foram 10 anos de enfrentamento. Centenas de artigos, palestras, debates e entrevistas. Desde setembro de 2014, saí pelo Brasil para denunciar os excessos e os abusos, mesmo sem conhecer o tamanho exato do golpe e a dimensão da estrutura criminosa. Combati o bom combate com grandes prejuízos pessoais e financeiros. Perdi dezenas de clientes, inclusive para pseudoadvogados que serviam de linha auxiliar do juiz e do Ministério Público. Mas como valeu a pena!
Para dar um só exemplo, recebi, nesta semana, um áudio de um ex-senador que foi preso pela Lava Jato e teve agora seu processo anulado. Ele, ao me agradecer, ressaltou o quanto era importante, para quem estava encarcerado no Paraná, ouvir minhas entrevistas e ler meus artigos fazendo o enfrentamento daquele bando da República de Curitiba. Ele me disse que se reuniam na prisão e que minha voz dava ânimo e esperança a eles. Confesso que me emocionei e tive, mais uma vez, a certeza de que valeu a pena toda a exposição e todo o combate. Nesse mundo tão desigual e injusto, é raro a justiça prevalecer.
Remeto-me a Paul Éluard, nos últimos versos do seu imortal soneto “Liberté”, em homenagem aos que foram presos injustamente:
“Em meus refúgios destruídos
Em meus faróis desabados
Nas paredes de meu tédio
Escrevo teu nome
Na ausência sem mais desejos
Na solidão despojada
E nas escadas da morte
Escrevo teu nome
Na saúde recobrada
No perigo dissipado
Na esperança sem memórias
Escrevo teu nome
E ao poder de uma palavra
Recomeço a minha vida
Nasci para te conhecer
E te chamar
LIBERDADE”