Foi uma semana difícil para os defensores da igualdade no Brasil. Por 17 votos a 5, a Câmara dos Deputados decidiu que o conceito de família está restrito a núcleos familiares formados por um homem e uma mulher.
Isso não significa apenas um retrocesso dos direitos homoafetivos e da igualdade. Significa que mães solteiras e seus filhos não formam uma família; avós que criaram seus netos não formam uma família; irmãos órfãos que se cuidam mutuamente não formam uma família.
Segundo pesquisa do Instituto Data Popular, 31% das mães brasileiras são solteiras. Vinte milhões de mulheres que são, de fato, a única referência de família de seus filhos e não foram reconhecidas como tal pelo Estado. É oficial: nosso país cria leis que nos violentam.
Há apenas uma coisa que espanta mais do que a proporção assustadora de votos: o argumento utilizado para a aprovação. Segundo o Deputado Federal Diego Garcia (PHS), “relações de afeto” não podem ser a base para decidir o que é uma família.
Além de paradoxalmente contrariar toda a lógica do próprio direito de família, assusta a incoerência desse argumento. Senão o afeto, o que mais pode ser considerado para que se determine o que é uma família? Laços sanguíneos, ignorados todos os dias por pais que abandonam seus filhos biológicos?
Este é o resultado do lamentável avanço da bancada evangélica: a religião tem ditado as regras. E a aprovação deste projeto é a prova de que não existe coerência quando decisões políticas são influenciadas por ideologias religiosas. É uma prova de que o fundamentalismo é o novo câncer da política brasileira, que vem se espalhando silenciosamente e tomando proporções inacreditáveis. É a demonstração clarividente de que a guerra entre o conservadorismo e a igualdade tem atingido a todos nós indistintamente.
A aprovação do estatuto da família é um claro ataque aos direitos homoafetivos, mas representa, no plano prático, muito mais do que isso: a involução do conceito de uma das mais importantes instituições sociais. Isso não atinge apenas as famílias – sim, famílias – homoafetivas, mas a todas as famílias não nucleares do Brasil, e o Congresso Nacional sabe disso. Mas a vitória do conservadorismo é e sempre será o mais importante.
Oficialmente, a bancada evangélica venceu a coerência.