Suplicy acertou ou errou ao isentar a Cultura de culpa? Por Paulo Nogueira

Atualizado em 29 de outubro de 2015 às 19:47
Reação reprovada pelos simpatizantes
Reação reprovada pelos simpatizantes

Certas atitudes são tão baixas que são elevadas. Ou tão elevadas que são baixas. Ou tão lindas que são horríveis. Ou tão horríveis que são lindas.

É o paradoxo da vida.

Para mim, a atitude de Suplicy diante do comportamento indecente da Livraria Cultura foi tão lindo que foi horrível.

Ele ofereceu a outra face, cristãmente, depois de receber uma bofetada de uma livraria que permitiu a um grupo de desordeiros que o agredissem moralmente.

Mas eis um momento em que não faz nenhum sentido oferecer a outra face. Para lembrar uma grande sentença bíblica contida no Eclesiastes, há um tempo para cada coisa.

Há um tempo para florescer e há um tempo para murchar. Um tempo para nascer e um tempo para morrer.

E há um tempo para oferecer a outra face e um tempo para devolver a bofetada.

Não estou dizendo que Suplicy deveria se atracar com a desequilibrada que comandou os analfabetos políticos que o insultaram.

Muito menos que ele deveria queimar os livros da Cultura.

Mas isentar a livraria de culpa?

Ora, não há sentido nenhum nisso. A Cultura foi, sim, culpada por não garantir a integridade física de Suplicy.

Foi, também, culpada por permitir que celerados perturbassem a paz dos cidadãos de bem que foram procurar livros em suas dependências numa manhã de sábado.

E deve ser cobrada por tudo isso.

Dado o avanço nas hostilidades de grupos de extrema direita, reações enérgicas se impõem.

Mantega deve ser aplaudido, por exemplo, por ter intimidado judicialmente os dois homens que o perturbaram num restaurante de São Paulo.

Eles tiveram que se retratar. Também tiveram que procurar e pagar advogado. Receberam de volta o aborrecimento que provocaram.

É assim que deve ser.

É improvável que outras pessoas voltem a incomodar Mantega num restaurante.

Tenho citado com frequência um jurista alemão do século 19 chamado Rudolph von Ihering. Ele, num livro clássico, consagrou a tese de que buscar reparação é, mais que um direito, uma obrigação da pessoa diante da sociedade.

Você protege não apenas a si mesmo como a outras potenciais vítimas de ataques que você tenha sofrido.

Considere Lula.

Quando ele processa um jornalista que o caluniou, ele está mandando uma mensagem clara. Este jornalista vai pensar muito antes de voltar a caluniar alguém.

As reações de simpatizantes de Suplicy mostram o quanto ele errou o ponto.

Virtualmente ninguém aprovou seu gesto.

Há uma expressão em alemão chamada Zeitgeist, o espírito do tempo.

Suplicy não captou o espírito do tempo.

Definitivamente, não é hora de oferecer a outra face porque uma nova bofetada, ou coisa pior, virá.