O processo vergonhoso da prisão de Lula culmina numa juíza que condenou um réu não reconhecido pela vítima. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 11 de março de 2016 às 8:43
Os promotores Fernando Henrique Araújo, Cássio Conserino e José Carlos Blat
Os promotores Fernando Henrique Araújo, Cássio Conserino e José Carlos Blat

 

Com reportagem de Pedro Zambarda

 

O processo da prisão de Lula deflagrado pelo MP de São Paulo entrará para a história como uma ode à irresponsabilidade, com enormes pitadas de humor involuntário, tragicomédia e ignorância.

O documento protocolado pelos promotores José Carlos Blat, Cássio Conserino e Fernando Henrique Araújo tem como função jogar gasolina na fogueira do protesto de 13 de março. Conserino, que julgou e condenou Lula na Veja há semanas, finalmente cumpre o prometido.

A desculpa é que Lula estaria sendo blindado. “Sabidamente possui poder de ex Presidente da República, o que torna sua possibilidade de evasão extremamente simples.”

É preciso conter Lula e “toda a sua rede violenta de apoio” — uma versão ainda mais cínica e esdrúxula do despacho do delegado que fez a condução coercitiva, alegando que estava levando o ex-presidente a Congonhas para “proteger sua imagem”.

Resultado: movimentos sociais convocaram seus militantes para um protesto imediatamente. Ninguém poderá se surpreender se houver, no domingo, uma conflagração.

No item 129 da denúncia, lê-se: “As atuais condutas do denunciado LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, que outrora chegou a emocionar o país ao tomar posse como Presidente da República em janeiro de 2003 (‘o primeiro torneiro mecânico’ a fazê-lo de forma honrosa e democrática), certamente deixariam Marx e Hegel envergonhados”.

O trio estava se referindo a Karl Marx e Friedrich Engels. Por açodamento e burrice, trocaram Engels pelo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831). Hegel é reconhecidamente um dos maiores pensadores da corrente dialética e do historicismo, mas não da esquerda.

Menciona também que “é nesse contexto que se traz à luz, notícia de que o denunciado LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA protagonizou verdadeiro ataque às instituições do Sistema de Justiça, fato ocorrido em vídeo gravado pela deputada federal Jandira Feghali, conforme abaixo noticiado e possível de visualização na rede mundial de computadores (internet).”

“Um vídeo gravado pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoB) de apoio a Lula saiu pela culatra. Tudo porque, antes que ela fale qualquer coisa, é possível ouvir Lula dizendo “eles que enfiem no cu todo este processo”.

O que isso tem a ver qualquer coisa?

Nem o pobre Nietzsche é poupado. “Falou Zaratustra: ‘Nunca houve um Super-homem. Tenho visto a nu todos os homens, o maior e o menor. Parecem-se ainda demais uns com os outros: até o maior era demasiado humano.’ Fundamental a referência à obra do filósofo alemão Friedrich Nietzche, pois de forma muito racional estabelece que todos os seres humanos se encontram em um mesmo plano138, premissa maior que norteará toda a construção do pedido de prisão preventiva do denunciado LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA, qual seja, a do princípio constitucional da isonomia”.

O caso está nas mãos da juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal de São Paulo, e não há prazo para decidir o caso. Como tudo o que é ruim sempre pode piorar, uma informação relevante: em 2008 ela condenou à prisão um porteiro de 28 anos chamado Robson Nunes — que não foi reconhecido pela vítima de um assalto à mão armada.

De acordo com o Estadão, “os bons antecedentes, o trabalho fixo e as declarações de boa índole em favor de Nunes não foram considerados.”