A forte seca que afeta parte do Brasil, intensificada pelas mudanças climáticas, junto com a expansão desenfreada dos cultivos agrícolas, são os principais responsáveis pelo recorde de queimadas no Pantanal e na Amazônia.
Especialista em física aplicada a problemas ambientais e membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), Paulo Artaxo destacou em entrevista à Exame a necessidade de impedir os incêndios provocados deliberadamente pelo homem, especialmente aqueles destinados a abrir espaço para o agronegócio.
O Pantanal, a maior planície tropical alagada do mundo e lar de milhares de espécies de plantas e animais, registrou entre 1º e 20 de junho 1.729 focos de incêndio, o maior número já registrado para este mês desde o início da coleta de dados, em 1998. Além disso, desde janeiro, foram detectados mais de 2.600 focos de incêndio nesta região ao sul da Amazônia, superando os números do primeiro semestre de 2020, que foi o pior ano para o bioma, com um quarto da superfície do Pantanal consumido pelo fogo.
“O aumento das queimadas criminosas faz parte de um projeto político que está diretamente ligado às ações do poder legislativo e executivo”, ressaltou em 2021 a articulação “Agro é Fogo”, que reúne 30 organizações e pastorais atuantes na defesa da Amazônia, Cerrado, Pantanal e seus povos.
Citando que nas áreas da Amazônia Legal 44% das comunidades que sofreram com incêndios tiveram de enfrentar também ações de desmatamento e grilagem de terras, um dossiê reforçava que o contexto é de uma “sobreposição de violências”.
“São áreas ricas em sociobiodiversidade sendo desmatadas com tratores e fogo, e depois empobrecidas com gados e monocultura, tudo isso ao redor das terras indígenas”, aponta o relatório.
Ao ser questionado sobre as causas desse aumento alarmante nas queimadas, Artaxo foi enfático: “O Pantanal, assim como toda a região do Brasil Central, está enfrentando, em 2024, uma das maiores secas de sua história, causada pelas mudanças climáticas. No entanto, é crucial enfatizar que a maior parte desses incêndios é provocada intencionalmente. Esses incêndios, em sua maioria, têm como objetivo expandir a fronteira agrícola, o que gera prejuízos enormes para o ecossistema”, afirmou.
AGORA | O @billmask nos envia vídeo de Espírito Santo do Pinhal, município do interior de São Paulo, que está coberto de fumaça. Situação se repete em muitas outras cidades paulistas. Saiba mais em https://t.co/s24yBB6Gu1. pic.twitter.com/q1PByNkQZO
— MetSul #AjudaRS (@metsul) August 23, 2024
Quando perguntado se a maioria dessas queimadas é provocada pelo agronegócio, Artaxo não hesita: “Sim, praticamente todos esses incêndios estão relacionados à expansão da agricultura”. A combinação de condições climáticas extremas com a ação humana, principalmente motivada pela ambição de expansão agrícola, coloca o Pantanal e outros biomas brasileiros em risco extremo.
As recentes cheias no Rio Grande do Sul, também ligadas às mudanças climáticas e ao fenômeno El Niño, mostram como o impacto humano no meio ambiente está amplificando eventos climáticos extremos.
Segundo Artaxo, um centro de alta pressão estacionado na região dos estados de São Paulo e Mato Grosso agravou a situação de precipitação no Rio Grande do Sul, enquanto as áreas do Pantanal se tornaram mais secas e, consequentemente, mais vulneráveis a incêndios.
Para evitar que 2024 seja o pior ano de incêndios na história do Brasil, Artaxo sugere ações enérgicas: “É preciso mobilizar a Polícia Federal, o Exército e utilizar todos os meios legais disponíveis para combater os incêndios criminosos. A maioria desses incêndios não é autorizada legalmente e constitui um crime ambiental grave”.
Ele afirma que é possível fiscalizar áreas tão extensas como a Amazônia, desde que sejam definidas áreas prioritárias, onde a probabilidade de incêndios criminosos é maior.