No folclore do poder no Brasil é constantemente citada uma frase atribuída a Roberto Marinho: “Dos meus comunistas cuido eu”.
A Globo, num site oficialista, se orgulha dessa oração. O doutor Roberto teria protegido seus funcionários subversivos dos horrores da ditadura.
RM “posicionou-se contra a perseguição a jornalistas de esquerda. Desafiou a repressão ao se negar a fornecer a lista dos ‘comunistas’ que trabalhavam em seu jornal. Cobrou do governo o restabelecimento da democracia”, diz o texto.
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A reação do professor da PUC de São Paulo Reginaldo Nasser diante do convite para participar de um programa na GloboNews é um sinal eloquente de que a emissora está pagando um preço que não esperava pelo golpe que patrocina.
Nasser publicou o convite e sua negativa no Facebook. Pelo WhatsApp, a produtora lhe perguntou se ele poderia ir aos estúdios falar dos atentados na Bélgica.
Uma hora mais tarde, Nasser devolveu: “Não dou entrevista para um canal que, além de não fazer jornalismo, incita a população ao ódio num grave momento como esse”.
Em circunstâncias normais, ele provavelmente não deixaria de lado a chance de dar seu recado na televisão. Nasser contou que frequentou bastante em outras ocasiões.
“Sempre avaliei que, eventualmente, em crises, há um espaço para profissionais possam discutir relações internacionais”, falou à Forum.
“Mas, nos últimos anos, eu comecei a notar que as coisas não estavam como antes. Inclusive, em dois programas ‘Painel’ editaram minha fala.”
Continua: “O que eles estão fazendo não é jornalismo. O ápice foi essa coisa apelativa, essa coisa de colocar no ar todo e qualquer diálogo em esfera privada da presidenta e de outras pessoas. Eu avalio que passou do limite”.
O fato de ter publicado as mensagens, sabendo que não voltará mais a aparecer ali, se deve a um esgotamento. Não só dele. Nada paga a ignomínia de colaborar para a canalhice.
No mesmo dia, a filha do cineasta Rogério Sganzerla, Sinai, também escancarou nas redes uma situação que, normalmente, ficaria no âmbito do privado.
Escreveu o seguinte:
“Pelo momento político que estamos vivenciando no Brasil, estimulado pelas organizações Globo (mesmo grupo da Fundação Roberto Marinho) que apoiou o Golpe de Estado em 1964 e também realizou diversas manipulações eleitorais, e pela atual posição que o jornalismo da empresa vem desenvolvendo, principalmente nos últimos dias, não iremos licenciar os trechos dos filmes do meu pai (Sem Essa Aranha e Copacabana Mon Amour) para a Fundação Roberto Marinho. Não desejamos vincular a obra de Rogério Sganzerla com uma instituição que estimula a violência e o desrespeito à democracia”.
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“Dos meus comunistas cuido eu” é uma sentença cafajeste, paternalista, megalomaníaca e feudal. “São meus cavalos. Esses vagabundos fazem o que eu mando”, é uma tradução possível.
“Obrigado, mestre!”, cacarejam os coitados.
Um dos artífices de 64 acerta com seus parceiros como quer lidar com seu povinho — que topou a parada, também, por motivos os mais diversos.
A elegia desse momento vergonhoso termina assim: “À luz da História, O Globo reconhece que o apoio ao governo militar foi um erro porque a democracia é um valor absoluto. E quando em risco, ela só pode ser salva por si mesma.”