O fascismo esculhamba com qualquer debate. Por Moisés Mendes

Atualizado em 2 de setembro de 2024 às 7:00
O coach e candidato à Prefeitura de SP Pablo Marçal durante debate na Gazeta – Foto: Reprodução

O debate desse domingo na TV Gazeta, com os candidatos a prefeito de São Paulo, aponta para um cenário não tão distante: os próximos confrontos, nas eleições pós-Marçal, podem ter um debatedor do PCC. Não mais um emissário ou alguém com franquia nutela e genérica da bandidagem.

Não mais, como disse Ricardo Nunes, referindo-se a Marçal, um tchutchuca do PCC, mas um chefão genuíno, legítimo e assumido da raiz do crime organizado. É uma distopia que não pode ser desprezada..

A extrema direita não só naturalizou sua existência, como se apropriou de espaços e ferramentas que no século 20 eram dominadas pelas esquerdas.

Marçal domina o mundo digital e prova que pode controlar também, pela esculhambação, o velho mundo analógico e até então cerimonioso dos debates na TV. É um estágio adiante, pela polivalência, em relação ao bolsonarismo clássico.

Diziam, com Lula preso, que Bolsonaro seria demolido em debates eleitorais. Bolsonaro debateu com Lula em 2022 e chegou a passar a mão nas costas do adversário, para dizer que estava seguro.

Marçal sobe vários degraus e fica mais à vontade num debate na TV do que no alto de um pico da Serra da Mantiqueira. Porque não há como debater com ele. E o sujeito não precisa chamar bombeiros para salvá-lo.

Esse tipo de confronto não funciona mais com esse tipo de gente, mesmo que sejam feitas mudanças superficiais em seus formatos. Tudo ficou normal. É normal que Marçal enfrente Boulos e Tabata, mesmo que aparentemente não tenha nada a dizer.

É normal que, enquanto os outros falavam, ele ficasse fazendo o M com os dedos ou com a cabeça abaixada, atrás do púlpito, como se falasse com alguém. Porque o comando do debate foi frouxo diante da imposição do sujeito.

É normal que as palavras ditas e às vezes repetidas no debate tenham sido bandido, bananinha, amante do Bolsonaro, traficante, crime organizado, fujão, bandidinho, estelionatário, máfia, quadrilha, ladrãozinho de creche, merda, ladrão, vagabundo.

Todos entraram na trocação. O que facilitou o jogo de Marçal, que é não deixar jogar. O estelionatário condenado disse no debate que encontros como esse são apenas um teatro, porque ninguém vai conseguir discutir programas. Com ele nos debates, são mesmo.

Boulos e Tabata não conseguirão conter Marçal e outros fascistas na TV, nas redes ou numa praça, se o que estiver em questão for o embate de ideias. A política do debate público não lida mais com ideias, há muito tempo.

O jogo da lacração e dos cortes de vídeos chegou à perfeição com Pablo Marçal. Bolsonaro é um Atari dos lacradores ao lado do coach que diz se comportar como idiota como performance, porque essa é a mentalidade do eleitor.

Marçal é a última geração dos lacradores, dedicado a um mercado que pede idiotia e que alarga cada vez mais sua base imbecilizada no ambiente da campanha eleitoral.

O candidato do PRTB entrega o que o eleitor pede: uma frase, uma palavra ou só os sinais com os dedos. Por isso estamos indo ao encontro de um futuro próximo em que o crime organizado poderá estar presente num debate sem dissimulações.

O fascismo está vencendo pela capacidade de ser compreendido por idiotas verdadeiros e por falsos idiotas. As pesquisas que chegarão essa semana podem trazer o cara carimbado por Nunes como tchutchuca do PCC à frente de todos os outros.

Até a palavra final, de encerramento do debate, por sorteio, foi do cara chamado uma dúzia de vezes de bandido.

Originalmente publicado em Blog do Moisés Mendes