Um livro para traçar um paralelo entre 64 e 16: “Depois da Rua Tutoia”. Por José Cássio

Atualizado em 1 de agosto de 2016 às 16:28

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É quase impossível falar sobre o golpe parlamentar em curso no Brasil sem rememorar acontecimentos sobrevindos após 1º de abril de 1964. As duas conspirações tiveram apoio maciço dos industriais paulistas, FIESP à frente.

Essa promíscua ingerência, hoje “totenizada” no pato do Skaf e, ontem, no financiamento à Operação Bandeirante (Oban) expõe o que há de mais rasteiro nessa relação de parasitismo, nesse “meia nove” abjeto entre o poder econômico e a política.

A participação de empresários nos dois golpes não é novidade, mas é um filão que ainda tem muito a render aos jornalistas investigativos. Basta cavoucar aqui, vasculhar acolá para brotar chorume por todos os cantos.

Em se tratando do período ditatorial militar, até mesmo a negação sistemática em trazer a público documentos oficiais, por exemplo, já serviria como pauta. As Comissões da Verdade conseguiram exumar várias histórias, mas ainda há muito a ser descortinado.

O romance “Depois da Rua Tutoia” (11 Editora), do jornalista Eduardo Reina, trata de um tema pra lá de polêmico sobre essa época: o sequestro de bebês por agentes da repressão da ditadura brasileira, para serem entregues a apoiadores do governo.

Reina defende que essa prática hedionda, muito usual nos países do Cone Sul, principalmente na Argentina, também aconteceu no Brasil. Pretendia escrever um livro-reportagem, mas optou pelo gênero romance em razão das lacunas entre as histórias verdadeiras que precisam de documentos e declarações.

A obra traz personagens baseados em histórias reais de pessoas que lutaram contra, sofreram ou apoiaram a repressão nas décadas de 1960/70. A protagonista é Verônica – separada de sua mãe, militante de esquerda, logo após o parto em uma maternidade clandestina. Acaba sendo “adotada” por um influente empresário paulista, que comandava um grupo financiador do aparelho repressor.

A história criada por Eduardo Reina mostra o que aconteceu com a militante presa e com a filha, Verônica, que teve no cárcere. São as vidas que se seguiram depois da prisão no DOI-Codi da Rua Tutoia.

Com 240 páginas, Depois da Rua Tutoia é o primeiro romance do catálogo da 11 Editora – editora independente sediada em Jaú, interior paulista, que iniciou suas atividades em 2015 publicando livros de contos.

O livro apresenta um projeto gráfico interativo: os primeiros capítulos simulam documentos oficiais do Centro de Informações da Marinha (Cenimar) e estão contidos em um “envelope” com o timbre de confidencial, que precisa ser aberto. Sem isso, a narrativa não pode ser compreendida.

Ao estimular o leitor a acessar o que está oculto, a ideia é provocar uma reflexão: a de que todos os arquivos sobre a ditadura militar venham a público, para que a história recente do País possa ser reescrita e entendida.

Depois da Rua Tutoia pode ser adquirido no site da 11 Editora (www.11editora.com.br).