EM 1955, DEZ ANOS DEPOIS DA explosão da bomba atômica em Hiroshima, um grupo de 25 hibakushas voou para os Estados Unidos. Hibakushas é como são designados, em japonês, os sobreviventes da bomba. Aquela turma tinha uma peculiaridade: era composto apenas de jovens mulheres. Todas elas tinham sido desfiguradas na explosão. Os dedos de muitas tinham se unido com o calor da bomba. Mãos, assim, tinham se transformado em garras. Aquelas moças tinham ido para os Estados Unidos para ser submetidas a cirurgias plásticas gratuitas. Foram beneficiárias da ação voluntária de um empreendedor japonês.
Elas se tornariam conhecidas como As Donzelas de Hiroshima.
As donzelas ficaram 18 meses nos Estados Unidos. A chegada não foi fácil. Os americanos, até ali, tinham sido poupados das imagens de Hiroshima. Jornais, revistas, televisão não veiculavam os efeitos da bomba nas pessoas. Nem todas as cirurgias foram um sucesso. Numa delas, uma donzela morreu. Suas companheiras levaram suas cinzas para o Japão no retorno.
O choque para os americanos ficaria particularmente claro quando, num programa de televisão, o copiloto do Enola Gay, Robert Lewis, vê duas donzelas. “Meu Deus, o que fizemos?”, ele fala automaticamente. Os rostos não foram mostrados aos espectadores.
Outroas donzelas queimadas receberiam cuidados depois. Mas as cirurgias plásticas seriam feitas não mais nos Estados Unidos e sim no próprio Japão. Miyoko Matsubara, que posteriormente se tornaria uma ativista da paz, foi uma das jovens reconstruídas na medida do possível. Miyoko tinha 12 anos e estava na 7.a série quando a bomba caiu. Adulta, ela escreveu sobre o que foi Hirochima em agosto de 1945. Particularmente, no dia 6.
Eram, teoricamente, férias escolares. Mas por causa da guerra os estudantes japoneses não tiveram folgas. Foram recrutados para ajudar em tarefas para as quais não havia braços suficientes. Miyoko ouviu uma colega apontar para o céu às 8h15 da manhã de 6 de agosto e mostrar um avião do qual se projetou algo. Era a bomba. “Quando veio a explosão, meu primeiro pensamento foi que o avião tinha caído em mim”, escreveu ela.
Miyoko desmaiou. Só acordou quando já era noite, muitas horas depois. Sobrara das roupas a lingerie e ela tinha queimaduras em todo o corpo. A cidade destruída estava em convulsão. Nada funcionava. Os mortos se empilhavam pelas ruas destruídas. Até conseguir chegar a sua casa, ela enfrentou, aos 12 anos, uma jornada pavorosa. Hiroshima parecia um “filme de terror”, escreveu ela. Quando, depois de uma convalescença de oito meses, ela voltou à escola, estavam vivos apenas 50 dos 250 alunos. Sua mãe, ao vê-la desfigurada, tinha duas reações. “Primeiro, ela lamentava que tivesse sido eu e não ela”, escreveu Miyoko. “Depois, dizia que teria sido melhor eu ter morrido na explosão.” Miyoko se acostumou a não se queixar para não aumentar ainda mais a dor da mãe.
Sessenta e cinco anos depois, muitas das donzelas de Hiroshima já estão mortas. Mas a imagem de seus corpos deformados é um testemunho eterno do horror da bomba atômica.
É uma pena que durante uma década a sociedade americana não tenha visto as meninas de Hiroshima. Os rostos e os corpos deformados talvez gerassem nos americanos uma atitude menos complacente em relação às guerras em que seus presidentes têm feito seguidamente o país entrar.