Nunca agradeci elogios machistas – sempre que pude, aliás, repreendi-os como se fossem (porque são) críticas das mais ofensivas.
Em todos os comentários aos meus textos em todos os veículos para os quais escrevo ou já escrevi há comentários que remetem à minha aparência ou forma física. “Para uma feminista até que é bonita” é o campeão invicto.
Um dia li algo como “escreve mal, mas é gostosa”, e fiquei tão perplexa que não sabia se ria – de tão patético – ou chorava. Poderia ter dito só “escreve mal”, já que, para escrever, pouco importa ser “gostosa” (?) ou não.
O problema, percebam, não é ser criticada ou elogiada: é querer simplesmente ser avaliada apenas pelo meu trabalho, e o meu trabalho não é ser “gostosa”.
O tipo de homem que enxerga uma mulher apenas sob o viés da beleza não está só na internet: está nas salas de aula, nas plateias de palestras, nos grandes centros corporativos e, é claro, na política.
Marcelo Crivella, candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, é um exemplar perfeito desse tipo.
No debate de ontem, enquanto Freixo chamava sua vice Luciana Boiteux de co-prefeita, e reconhecia a importância de políticas públicas voltadas para as mulheres, Crivella escolheu ser “galanteador” (Políticos “galanteadores”: alô, Família Bolsonaro!) e disse às apresentadoras que “o debate com certeza foi esse sucesso todo por causa da beleza de vocês, que encantou os telespectadores.” (Aqui, o vídeo.)
É de doer. Toda mulher que já se sentiu invisível pelo trabalho que desempenha – ofuscada, na verdade, pela ideia de que as mulheres precisam ser sempre lindos bibelôs decorativos – sabem o que elas sentiram com esse “elogio”.
Nenhuma das duas apresentadoras agradeceu. Claro, nenhuma mulher precisa agradecer um elogio que lhe exalte a beleza e, consequentemente – porque uma coisa está necessariamente ligada à outra – lhe diminua as competências profissionais.
Mariana Godoy – que, sejamos justos, cometeu a gafe de presentear a Presidenta Eleita com um livro de FHC, mas agora sente na pele o mesmo machismo que sustentou o golpe – usou a arma mais eficiente, e, por que não dizer, divertida contra o machismo do Bispo Xavequeiro: Mandou um tchauzinho de Miss para se despedir, com a expressão mais sarcástica que eu vi no telejornalismo dos últimos tempos. (Tchauzinho, Crivella machista.)
É isso que querem de nós? Beleza e graça? É isso que somos, Misses simpatia?
“Não elogiar uma mulher apenas por sua beleza” é um aprendizado dos mais básicos para os homens que se preocupam minimamente com o Feminismo enquanto movimento político. Se Crivella não aprendeu isso, o mais básico, imaginem o que as mulheres cariocas devem esperar de seu governo caso ele vença.