Já faz algum tempo que a nenhum brasileiro é dado mais o direito de se surpreender com as irresponsabilidades de nossas instituições.
Depois que nos transformamos numa pátria sem lei onde os interesses privados se sobreporam aos direitos públicos com a plena anuência dos três poderes, a única garantia estabelecida é a de que já não temos mais garantias nenhuma.
O que se presenciou hoje (7) no plenário do Supremo Tribunal Federal foi o recrudescimento de um estado de coisas que aos olhos de qualquer nação minimamente organizada certamente já seria considerada como um pandemônio institucional.
Chamado a decidir entre a monocracia de um ministro do Supremo sobre um segundo poder e a permanência de um réu na linha sucessória presidencial, a Suprema Corte inovou na sua predisposição à conveniência política.
Sob a humilhação de ter tido um mandado judicial jogado às favas por uma espécie de sultão a quem as leis não são imputáveis, Marco Aurélio Mello descobriu que existem muito mais coisas entre a jurisprudência formada e o interesse econômico do que a nossa vã filosofia pode imaginar.
O que horas antes era tido como uma “vitória acachapante” se transformou melancolicamente numa derrota esmagadora para o ministro relator. A bem da verdade, por 6 votos a 3 o plenário decidiu não ser nem contra nem a favor, muito menos pelo contrário.
Diante do dilema de corroborar com uma maioria já estabelecida no próprio Supremo que impossibilita réus de ocuparem cargos na linha de sucessão da presidência da República ou garantir a tranqüilidade de um governo ilegítimo que eles mesmos ajudaram a colocar, pôs-se em prática uma terceira via.
Para o delírio dos golpistas, chegou-se à conclusão que Renan Calheiros permaneceria no cargo sem, porém, poder substituir o presidente da República no caso de ausência deste e do presidente da Câmara.
É uma aberração jurídica. Um jabá, se preferir.
Com esse novo entendimento criado ao gosto do freguês, não sem alguma razão o nosso querido Eduardo Cunha poderá se sentir de alguma forma injustiçado. Afinal, se um réu como Renan pode ser presidente do Senado, o que impede que um réu como Cunha seja presidente da Câmara?
Eis o caos em que nos encontramos. À medida que trocamos a Constituição Federal pelo velho “jeitinho” brasileiro de acomodar as coisas, saímos do campo da decência para adentrarmos no lodo da imoralidade.
Alguém já havia dito, é justamente pelo “jeitinho” brasileiro que o Brasil não tem mesmo jeito.