O horror do assassinato do ambulante Luiz Carlos Ruas por dois jovens no metrô de São Paulo suscitou reflexões elevadas sobre a violência, a nossa apatia social, a coragem, a vida das pessoas invisíveis etc.
Como era inevitável, surgiu também uma leva de besteiras irresponsáveis. Uma delas saiu da boca do apresentador do “Bom Dia São Paulo”, da Globo, Rodrigo Bocardi.
Bocardi é o tipo que faz comentários na televisão. Eventualmente, espirituosos. Não no nível de Jorge Pontual, mas ele também preenche a cota de desinibidos da emissora, aqueles caras que são “fora da caixinha” e fazem aspas com os dedinhos.
No dia 29, Bocardi questionou a conivência do advogado dos dois homens que massacraram Ruas, perguntando ao público se o doutor, por saber onde estava um deles, também não deveria ser detido.
“Eu saí daqui ontem e fiquei pensando numa coisa que eu esqueci de falar. Como é que tem que ser a nossa reação diante daquela declaração de ontem do advogado de defesa? Ele dizia ontem, antes do segundo rapaz ser preso, que ele estava em contato com o cliente dele e que ele não iria se apresentar”, diz Bocardi.
“Gente, o Estado tem um mandado de prisão, o Estado está oferecendo uma recompensa de 50 mil reais pra quem oferecer qualquer denúncia, você tem um advogado que sabe onde está a pessoa e ele diz isso pra todo mundo. Será que o advogado não deveria ser preso também? É estranho, né? Enfim…”
Bocardi poderia ter consultado o departamento jurídico de sua empresa sobre relação de confidencialidade, direito de sigilo e outras coisas antes de dividir uma dúvida dessa natureza com o público.
Público que, aliás, está sedento de vingança, como é de se esperar. Na noite em que Alípio Rogério Belo dos Santos e Ricardo Martins do Nascimento foram transferidos, na Barra Funda, uma multidão gritava “assassinos” e ameaçava linchá-los. Os investigadores tiveram de soltar bombas de efeito moral.
Num momento de ânimos exaltados, faz sentido esse discurso demagógico? Não bastam os Datenas? Supondo que a questão seja pertinente, que tal um especialista para dialogar?
Bocardi anda está longe de ser uma Sheherazade de saias e não parece um sujeito que vai elogiar grupos de justiceiros que amarram jovens em postes.
Mas um pouco de sobriedade e inteligência sempre vai bem em horas dramáticas em que todos estão revoltados e parecem perdidos.
O Brasil já tem juízes justiceiros demais.