Publicado no JornalGGN.
POR CÍNTIA ALVES
Talvez o ministro Marco Aurélio Mello deva retornar aos holofotes da mídia e explicar se realmente falava sério ou despejava sarcasmo na entrevista que concedeu à Agência Estado nesta sexta (20), sugerindo que o ministro da Justiça do governo Michel Temer, Alexandre de Moraes, tem “bagagem” suficiente para substituir Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal.
A entrevista de Mello percorre portais noticiosos e redes sociais transformando parte dos leitores em comentaristas incrédulos por conta da avaliação (irônica, espera-se) de que Moraes teria condições de sentar-se em uma cadeira da mais alta corte do País.
O que aconteceu com atributos como notório saber jurídico associado à formação humanística e “leveza” para se tornar um juiz – coisa que Moraes não foi nem em primeira instância – de um tribunal onde as decisões são definitivas, ministro?
Mello também disse que a megaoperação na Petrobras e seus desdobramentos não “correm riscos” em função da nomeação de um novo nome para o Supremo, exceto pela possibilidade de Sergio Moro ser alçado ao posto e abandonar os trabalhos em Curitiba.
“O risco ocorreria, por exemplo, se escolhêssemos este grande nome da magistratura, para ir para o Supremo, né? Ressalto que é o juiz Sergio Moro. Por quê? Porque ele domina o processo que está em curso no Paraná, os diversos processos. E, no Supremo, estaria impedido de julgar, no grau recursal ou habeas corpus, esses processos, em que já havia atuado na primeira instância. Aí teríamos um duplo prejuízo, perderíamos uma pedreira da magistratura, que é a primeira instância e também no Supremo.”
“Este grande nome da magistratura” não combina com a advertência que Mello fez em relação a Moro quando do episódio do vazamento de um grampo que envolvia a ex-presidente da República Dilma Rousseff.
Naquela ocasião, o magistrado apontou que Moro, ao divulgar o aúdio que deveria ser sigiloso para uma emissora de TV, cometeu um crime. “Isso é crime, está na lei. Ele simplesmente deixou de lado a lei. Isso está escancarado”, disparou, acrescentando que não é possível “avançar culturalmente” quando juízes atropelam a Constituição.
Na condução coercitiva de Lula, Mello também criticou Moro, afirmando que a linha de atuação do juiz de primeira instância tinha contornos de “retrocessos”.
Talvez Marco Aurélio Mello, desde que foi voto vencido no julgamento que poderia ter afastado Renan Calheiros da presidência do Senado, tenha jogado a toalha em relação a este Supremo – que Lula, em outros momentos, chamou de “acovardado”.
Um dia após o julgamento, Mello deu uma entrevista ao jornal O Globo denotando certo desapontamento por seus colegas terem sucumbido a um “acordão” para manter Renan no cargo, com a desculpa de que ele é essencial às reformas que o governo Temer trama para o País.
Quando questionado se, ali, o STF se acovardou, Mello respondeu: “Em meu voto, disse que o Supremo não podia se despedir do dever de tornar prevalecente a Constituição. Isso está com todas as letras em bom vernáculo no voto. Foi realmente um voto contundente e reforçado no tocante ao que se apontava na véspera como um acordão. Para nós, importante é o acórdão, não o acordão.”
Na mesma conversa, disse que era “voto vencido”, mas não estava “convencido” de que a corte tomara a decisão certa. E foi além: sinalizou que o Supremo será aliado do governo Temer e seus colegas no Congresso, quando questionado sobre uma eventual crise entre as instituições. “O entendimento entre os Poderes parece que está muito afinado, viu?”, alertou.
Ao final, o ministro ainda comentou que a única coisa boa que tirou desse embate com Renan Calheiros e uma banda do Supremo que chegou a pedir seu impeachment, foi o apoio das massas. “Está chegando ao fim dos meus dias de juiz, depois de 38 anos. Assim, de certa forma reconhecido pelos meus concidadãos, é muito bom para o homem público. É melhor que o contracheque”, disse, para seu próprio conforto.
Talvez, apenas talvez, Marco Aurelio Mello tenha sugerido que Alexandre de Moraes é o ministro que convém a Temer indicar para este Supremo – o que não seria espantoso dizer, dado os interesses em jogo. Assim desejamos ler, para nosso próprio conforto.