Publicado no Justificando.
POR GABRIELA CUNHA FERRAZ, advogada e ativista
Há dias a mídia vem ocupando páginas e páginas com a mesma notícia: Um hacker invadiu a conta virtual da Marcela Temer, copiou fotos privadas, foi interceptado pelo Alexandre de Moraes e preso por extorsão.
O único ponto que me parece preocupante em toda esta história é a alegação de que este teria sido o real motivo que levou o Alexandre de Moraes a assumir a cadeira de Ministro da Justiça e, posteriormente, Ministro do Supremo Tribunal Federal. Não chego a ficar precisamente espantada porque desde a época em que os portugueses aqui estavam, essa sempre foi a forma de se fazer política no Brasil. As pequenas barganhas, o sexo, as drogas e as reuniões regadas à charuto e whisky fazem a diferença nestas bandas.
Convenhamos, também, que essa parece ser a única razão possível para explicar a permanência de alguém como o Alexandre que, comprovadamente, não possui o arcabouço teórico e as competências exigidas para assumir pastas de tamanha importância para o país. Porém, curiosamente, este é o ponto menos abordado nos perniciosos comentários que, até então, explodiram na internet.
A grande maioria dos comentários feitos sobre este tema tenta destruir a imagem da Marcela, como se ela estivesse, em algum momento, “errada”. Cheguei até mesmo a receber montagens bárbaras de nudes atribuídos à Marcela que me fizeram lembrar os nefastos adesivos comercializados para destruir a imagem da Presidenta Dilma Rousseff, ao atacar sua feminilidade de forma grosseira e absolutamente criminosa.
Antes de qualquer coisa, importante frisar que a única pessoa errada dessa história é, para variar, o Alexandre de Moraes que soube aproveitar a situação de vulnerabilidade em que uma mulher se encontrava para extorquir favores pessoais que impactaram, negativamente, na vida de todos os brasileiros (e brasileiras!). Aliás, essa é uma fórmula comum em muitos lares e, também, em instituições públicas: Homens vaidosos que exploram e destroem mulheres para benefício próprio ou de sua imagem.
Porém, existe aqui uma forma brutal de violência que precisa ser evidenciada. Há anos, estamos tentando visibilizar o caso de mulheres – jovens ou adultas, que tiveram sua privacidade atacada e sua vida sexual exposta em redes sociais. Alguns destes casos chegaram aos tribunais brasileiros e os juízes negaram haver qualquer tipo de violência que ensejasse reparação de danos ou pagamento de indenizações morais. Outras vezes, as vítimas precisaram ouvir juízes machistas proferindo sentenças e registrando barbaridades sobre sua conduta e suposta reputação. Ainda há casos em que algumas meninas suicidaram por não conseguirem reunir forças para lutar contra a humilhação e o Bullyng que sofreram.
A diferença deste caso está no fato de que o sistema de justiça brasileiro reflete todas as desigualdades vividas no país em suas decisões. Considerando que aqui reina o critério do “dois pesos e duas medidas”, a Marcela não precisou passar pelo constrangimento vivido por outras meninas já que, no seu caso, o sistema agiu rapidamente e encarcerou o hacker, sem precisar levantar maiores questionamentos obre sua honra pessoal. Parece-me que, finalmente, teremos uma forte jurisprudência para trabalhar nos próximos anos.
Ao nos concentramos apenas em destruir a reputação da Marcela, entramos na velha ciranda de um sistema misógino e não evidenciamos o problema em si. Para quem ainda pensa dentro do velho formato, eu pergunto: Qual teria sido afinal, o crime cometido por todas essas mulheres? Mulheres maduras, lindas e com vida sexual ativa deveriam ser idolatradas e não criminalizadas.
Pois bem senhores, a Marcela transa, eu transo e todas nós transamos e queremos gozar (choque!). É preciso perceber que o impacto negativo provocado pelo revenge porn sobre a imagem das mulheres vem, exatamente, em razão da extrema perversidade do sistema machista. Perdemos, diariamente, vidas em vão em um país inebriado pelo seu machismo institucional. Em resumo: A Liberdade sexual das mulheres mata!
Dito isso, resta óbvio que estamos diante de um assunto de foro privado e que, portanto, deve ser conversado de forma privada. Não cabe a ninguém opinar sobre a vida sexual de outra mulher ou decidir se ela deve ter uma vida monogâmica ou poligâmica. Até onde esse assunto nos concerne, deveríamos concluir que todas nós podemos nos relacionar com quem (ou “quens” ou “queers”) quisermos.
Obviamente que este caso ganhou maior repercussão porque todas nós nos lembramos da vergonhosa capa da Revista Veja que empurra a Marcela para uma posição ridícula de “Bela, Recatada e do Lar”. A mídia e os assessores de imagem do Palácio do Planalto tentaram, de todas as formas, atribuir uma imagem de moça Poliana e bem-intencionada à Marcela! Porém, a mera suspeita de existirem fotos íntimas é simplesmente libertadora e comprova que a natureza humana ultrapassa as barreiras publicitárias. Por isso, caso esse material realmente exista, a Marcela terá todo o meu apoio. Por mais Marcelas e menos Alexandres! Pela liberdade das mulheres!