Além de sua penugem tucana, um dos motivos para João Doria ter virado o maior media darling nacional é ele trafegar com desenvoltura numa área particularmente sensível do jornalismo: a do jabá.
Doria sabe lidar com os vícios da categoria.
Em seu famoso Fórum de Comandatuba, realizado anualmente num belo resort na Bahia, há uma farta distribuição de presentes aos profissionais que vão “cobrir” o evento
Diretores de redação, repórteres, fotógrafos — além de políticos e empresários — ganham brindes dos patrocinadores. Não cabem numa mala. Há uma serviço para despachar os mimos.
Nelson Blecher, por exemplo, ex-diretor da Época Negócios, era famoso por voltar à redação cheio desses agrados. Blecher, sejamos justos, nunca foi o único.
As matérias sobre o encontro são todas positivas. Pago um Chicabom a você se encontrar qualquer crítica nos relatos sobre esses encontros do Lide. Qualquer, repito. Nunca chove no local.
Companhias aéreas, restaurantes, hoteis, montadoras, estúdios de cinema movimentam muito dinheiro levando coleguinhas para EUA ou Europa para ver um filme, testar um jipe, conhecer uma cidade ou comer num lugar bacana para, depois, ganhar uma boa resenha.
Na Viagem e Turismo e no Guia Quatro Rodas, que eu dirigi, não aceitávamos convite, uma norma da Editora Abril. Não sei como é hoje.
Norma, aliás, violada pelo dono, Roberto Civita, que mandou dar matéria sobre o Instituto Inhotim na Veja depois de passear na faixa em Minas com o patrocínio de Aécio Neves. Civita utilizou até o helicóptero do estado. Ou seja, as regras valiam para a indiarada.
Doria repete essa receita na prefeitura. Ele sabe organizar esses passeios e azeitar as engrenagens dessa máquina de empulhação.
Suas turnês comerciais, em que ele carrega consigo, embedados, órgãos de imprensa variados, replicam esse modelo de suborno.
Primeiro foram os Emirados Árabes Unidos. A turma retratou seu rolê entre emires e marajás como se ele fosse uma espécie de Marco Polo na China.
Agora é a Coreia do Sul.
Estadão, Jovem Pan, Folha e Band colaram no prefeito, garantindo em matérias laudatórias que o passeio a Seul foi um sucesso absoluto e o won vai inundar São Paulo.
Segundo a Band, “a Samsung, maior empresa do país, já se comprometeu a implantar um sistema que vai facilitar o pagamento de tarifas na capital paulista”.
A Pan jura que ele “firmou acordos importantes” e “analisou perspectivas para a capital com base em exemplos sul-coreanos”.
Graças à JP fomos alertados de que Doria não vai batizar o Bom Retiro de Little Seul.
Nenhuma das emissoras avisa que seu empregado está lá com todas as despesas pagas.
O Estadão avisa que Pedro Venceslau foi “a convite da prefeitura de Seul”, mas não explica nada além disso. Quem fez essa triangulação? Doria combina com o jornal e as autoridades de Seul?
Nos textos reproduzidos em outros sites, como o UOL, esse “esclarecimento” não aparece.
No Estadão, a sabujice alcança níveis estratosféricos. “Empresários cortejam tucano”, ficamos sabendo. Doria “chegou a ser chamado de ‘futuro presidente do Brasil’”.
Nosso embaixador “não se lembra de um prefeito que tenha buscado recursos de modo tão intenso”.
A Coluna do Estadão também informou que Doria, veja só que exemplo de homem público, “preferiu ele mesmo passar seus ternos e camisas no quarto. Não quis gastar dinheiro e nem perder tempo”.
Essa troca de favores se chama corrupção. Isso é comprar uma opinião. É degradante.
É desonesto com o pobre leitor, ouvinte ou telespectador, chamado de trouxa na cara dura.
Mas é como João Doria, o “gestor”, opera. Ele sabe apertar os os botões certos dos amigos.
Uma picaretagem é usada para aclamar um político que se vende como o único não picareta do universo.
É assim que, enquanto um trator atropela a classe política, a imprensa cria e alimenta uma farsa, a nossa versão yuppie e mais botocada de Berlusconi.