Há duas partes ausentes na enxurrada de delações da Odebrecht que as deixam francamente mancas: a mídia e o Judiciário.
O patriarca Emílio fez um desabafo que se tornou conhecido.
“O que me entristece, inclusive eu digo aí, a própria imprensa. A imprensa toda sabia de que efetivamente o que acontecia era isso. Por que agora estão fazendo isso? Por que não fizeram isso há 10, 20 anos atrás?”, pergunta.
“Essa imprensa sabia disso tudo e fica agora com essa demagogia”. Segundo Emílio, deveria haver “lavagem de roupa nas suas casas”.
Emílio detalhou um pouco mais seu relacionamento com os órgãos de comunicação.
A conversa na Lava Jato é elucidativa mais pelo que ele deixa de falar: o interrogador só se interessa pelo relacionamento de Lula com a Carta Capital.
Segundo o insuspeito Gilmar Mendes, na operação comandada por Moro “há um tipo de negociação, de falar aquilo que o outro quer ouvir.”
Emílio é questionado se a “ajuda” de Lula à Carta teria como objetivo impedir reportagens contrárias à empreiteira.
E aí entrega uma rapadura que não era esperada.
“Por exemplo: fazer uma divulgação do balanço que nós não fazíamos normalmente em determinado veículo. A legislação não obriga você a fazer em todos. Eu posso ampliar para mais um. É uma receita adicional que entra em compensação ao dinheiro que foi emprestado. Isso daí sempre existiu”, diz.
O procurador questiona acerca de outros casos. “O Estadão, várias vezes. Começou na época do Mesquita, ainda. Do Julio Mesquita”, afirma.
Era nos mesmos moldes da Carta?
“Mesmo. Nesse molde. Eram dificuldades momentâneas dos veículos”, conta.
Atenção: começou com Julio de Mesquita Neto, diretor responsável do diário paulista entre 1969 e 1996. Isso significa que continuou depois.
O advogado então observa que, para os outros, o contato com o então presidente era direto. Eureca!
“Exatamente. Perfeito. Pronto, chefe. Essa é que eu acho que é a diferença. Gazeta Mercantil? Era o [Herbert] Levy [o antigo dono], direto: ‘Emílio, estou precisando’. Era privado com privado. Aí teve uma origem. É diferente”, diz Emílio.
Num trecho de sua delação, Marcelo Odebrecht comentou, por sua vez, que houve “outros apoios semelhantes”.
“Nós fizemos um fundo para fazer empréstimo para o grupo que controla o Correio Braziliense”, afirma. “Não era algo anormal”.
O “doutor” Julio foi canonizado como defensor das liberdades democráticas e inimigo feroz dos censores (uma lenda urbana que serviu para mitigar o papel do Estado de S.Paulo como conspirador e apoiador de primeira hora do golpe de 64).
Emílio e o filho certamente têm muito mais a desfiar sobre como os Mesquitas e seus correlatos vinham-lhes com o pires na mão — o que, até segunda ordem, não é crime.
Ampliaria o quadro e auxiliaria na compreensão do papel desses cruzados contra a corrupção, que só estão noticiando esquemas gargantuescos agora.
Poderiam detalhar a “parceria” da Odebrecht com o Museu do Amanhã, administrado pela Fundação Roberto Marinho, também.
Mas esbarraram num tipo de conversa em que o interlocutor quer apenas elementos para a velha conta de chegada em que o nome de Lula aparece no centro do powerpoint.