A notícia de que a Odebrecht depositou o equivalente em dólares a 4 milhões de reais em uma conta no exterior para satisfazer um compromisso com José Serra traz de volta o nome de Miriam Dutra à corte tucana.
Segundo o executivo Luiz Eduardo Soares, a conta era de Jonas Barcellos, dono do grupo Brasif, que administra as lojas duty free em aeroportos do Brasil.
Miriam, que tem um filho que dizia ser do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, teve contrato de prestação de serviços assinado com a empresa de Jonas Barcellos no final do governo FHC.
Em entrevista gravada, concedida a mim em Barcelona, no ano passado, Miriam contou que esse contrato era de fachada, um artifício para que recebesse mesada de 3 mil dólares de Fernando Henrique Cardoso.
Assim como Jonas, da Brasif, Serra também se movimentou para ajudar Fernando Henrique no caso Miriam Dutra.
O apartamento que ela comprou em Barcelona foi reformado com a supervisão de Serra, que esteve lá pessoalmente e, segundo Miriam, orientava a liberação de dinheiro, juntamente com o primo, Gregorio Preciado.
A delação do executivo da Odebrecht indica que a relação entre Serra e Jonas vai além de Miriam Dutra.
Em 2010, Miriam Dutra continuava funcionária da TV Globo, mas não recebia o complemento da Brasif.
Em reportagem publicada pelo DCM em abril do ano passado, escrevi:
A tragédia da família Dutra se mistura a situações em que é difícil separar o assunto público do privado. Nos anos em que considera seu exílio na Europa, com salário da Globo e o dinheiro de um contrato fictício da Brasif, ela teria questionado Fernando Henrique quando a Brasif, empresa concessionária do governo federal, parou de transferir dinheiro – eram 3 mil dólares por mês.
— O Fernando Henrique disse: é claro, eu coloquei 100 mil dólares lá, e esse dinheiro já acabou.
A família não deixou de receber recursos, mas a Brasif, segundo Miriam, deixou de ser o canal.
A relação de Serra com Jonas da Brasif, no entanto, se mantinha.
A irmã de Miriam Dutra, a socióloga Margrit, trabalhava até o ano passado no gabinete de Serra no Senado.
Margrit foi casada com o jornalista Fernando Lemos, já falecido, de quem era sócio em uma empresa de lobby, a Polimídia, e ambos, assim como Miriam Dutra, eram muito próximos de Jorge Bornhousen, que foi vice-presidente da Brasif.
Eram todos de Santa Catarina.
Miriam contou que o cunhado é quem operacionalizou o contrato com a Brasif, para resolver dois problemas: o dela, Miriam, e o de Fenando Henrique.
“É assim que as coisas funcionam no lobby. Alguém sempre se movimenta para resolver os problemas”, disse-me, à época, Miriam.
Se o inquérito para apurar o propinoduto que liga a Odebrecht a José Serra for adiante, a Polícia Federal tem outras pistas além de Miriam Dutra.
Em 2010, na sua campanha a presidente, Serra foi confrontado com uma história nebulosa.
Naquele ano, teriam desaparecido 4 milhões de reais do caixa de campanha administrado pelo engenheiro Paulo Vieira Souza, conhecido como Paulo Preto, diretor de engenharia da Dersa, responsável pelas obras do Rodoanel.
Seriam os mesmos 4 milhões que agora, na delação da Odebrecht, aparecem como devolvidos à empresa, para que, convertidos em dólar, fossem depositados na conta de Jonas Barcellos no exterior?
É uma pista.
Paulo Vieira Souza e a irmã de Miriam, Margrit, muito ligada a Serra, talvez possam esclarecer alguns pontos.
PS: Margrit foi demitida no gabinete de Serra no Senado depois que Miriam Dutra disse que ela tinha um patrimônio incompatível com a renda de funcionária pública e era lobista.