A cracolândia sentiu mais uma vez o movimento ‘fechamento do fole’ na manhã deste domingo. No contínuo efeito sanfona a que tem sido submetida, a região sofreu novamente a repressão exercida na base da força de forma indiscriminada, tratando criminosos (traficantes) e usuários com a mesma truculenta maneira.
O método de arrancar tudo como um trator nunca deu resultado. Foi tentado por muitos outros. Inclusive Fernando Haddad foi pouco firme nessa questão, ainda que tenha sido o responsável pelo melhor plano e com os melhores resultados.
Mas Geraldo Alckmin – que esteve presente na operação deste domingo – não tem preocupações com os dependentes químicos nem com o combate rígido ao tráfico. Sua intenção é a de levantar muita fumaça com as bombas lançadas pela sua Polícia Militar e desviar um pouco a atenção do respeitável público.
As delações antes tão enaltecidas e respeitadas pelos pessedebistas agora estão voltadas também para o ninho tucano. E Alckmin está vendo seu sonho de tornar-se presidente um pouco mais distante.
Se Aécio Neves naufragar foi um bom negócio, Alckmin tem agora o Frankenstein Doria que ele mesmo criou a lhe atormentar (o pupilo declarou a respeito da operação de hoje: “Não há possibilidade da cracolândia voltar”).
Alckmin precisava de algo de efeito. Independentemente da eficácia.
“Dependência química é igual apendicite. Você precisa tratar da pessoa”, disse o médico governador. Tem algo mais reducionista?
Qualquer sinal de austeridade nessas operações é sempre facilmente derrubado. Caem em contradições de modo risível. A data da operação de hoje (domingo), segundo os responsáveis, foi escolhida em razão de ‘evitar transtorno à vida dos paulistanos’.
Só se for, como de costume, pensando no trânsito caótico dos dias de semana. Porque se a preocupação fosse com a segurança das pessoas, jamais poderia ter sido planejada para um dia em que ocorre a Virada Cultural, com grande quantidade de público pelo centro da cidade.
Não se está aqui defendendo a permanência daquele fluxo fétido e mórbido de humanos que mais se assemelham a zumbis. Muito menos respeitando o trabalho de traficantes. Mas a resolução do problema necessita de seriedade, comprometimento e perseverança a médio/longo prazo.
De nada adiantam essas operações que jogam para a torcida apenas. Aparecem num dia, atacam e destroem a tudo e a todos e depois de um tempo tudo volta com era pois e demanda e oferta continuarão por ali.
Pior, durante o curto período pós-operação rapa no qual a vigilância é mantida na região, proliferam-se mini cracolândias por toda a cidade. Daí fica-se igual a cachorro correndo atrás do rabo.
Em janeiro de 2014 acompanhei de perto, in loco, ao longo de dois dias a implantação do projeto Braços Abertos. O grau de degradação a que aquelas pessoas haviam se submetido para alimentar o vício é entristecedor. Eu torcia para que nada do que estava acontecendo fosse em vão.
“Nós estamos tratando isso como um problema de saúde, nós não vamos tratar com violência. Nós temos que aprender com o passado, não podemos repetir os erros já cometidos. Então vamos afastar qualquer tipo de abordagem higienista”, disse o prefeito Haddad na época. Mas por aqui toda troca de comando implica em abandono e troca de projetos. A autoria é colocada como prioridade.
A dependência química é um problema de saúde e o tráfico é um problema de polícia. Governantes como a dupla dinâmica Alckmin/Doria que misturam as duas coisas ou são despreparados ou mal intencionados.