Publicado no blog do Marcelo Auler.
O previsível aconteceu. Desde 17 de abril passado encontra-se nas mãos do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, um pedido de anulação de toda a Operação Lava Jato que ele deflagrou e comanda nos últimos três anos.
O inusitado é que a solicitação não partiu de nenhum dos políticos, empresários ou agente público acusados, processados ou já condenados por corrupção, desvio de verbas públicas, lavagem de dinheiro ou quaisquer outros crimes conexos. A iniciativa surgiu da “primeira colaboradora” da investigação, como alega seu advogado, Conrado Almeida Corrêa Gontijo.
Trata-se da ex-contadora do doleiro Alberto Youssef, Meire Bomfim da Silva Poza, que diz ter sido usada por policiais federais e procuradores da República como uma “informante infiltrada”.
Gontijo alega que ao desaconselharem que ela fosse assistida por um advogado quando serviu como informante pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, ambos de Curitiba, acabou privada do seu direito constitucional de ampla defesa. Mais ainda entregou documentos que hoje são usados contra ela, ou seja, forneceu prova contra si mesma.
O mais curioso é que denunciada por lavagem de dinheiro, na Vara de Moro, na Ação Penal nº 5056996-71.2016.404.7000, sua defesa utiliza as próprias palavras do juiz na decisão em que recebeu a denúncia para demonstrar a importância dela na apuração de todo este caso.
Meire auxilia a Força Tarefa da Lava Jato desde 29 de abril de 2014. A primeira prisão na operação, da doleira Nelma Kodama, ocorreu em 15 de março, dois dias antes da deflagração da primeira fase.
Quando Meire começou a “colaborar” não tinha surgido nenhum réu disposto a barganhar delação por redução de pena. Sua importância nessa empreitada é reconhecida pelo próprio juiz Moro ao acatar a denúncia:
Além de invocar as próprias palavras elogiosas do juiz, a defesa de Meire Poza arrolou nove membros da própria Força Tarefa da Lava Jato como testemunhas dela.
Ou seja, serão chamados a depor em juízo, caso o processo prossiga, procuradores, delegados e agentes da polícia que com ela conviveram através dos quais o advogado Gontijo pretende mostrar a nulidade da Operação.
Estão na relação de testemunhas: os procuradores da República Deltan Martinazzo Dallagnol e Carlos Fernando dos Santos Lima; os delegados Márcio Adriano Anselmo, Igor Romário de Paulo e Eduardo Mauat; os agentes Rodrigo Prado, Luiz Carlos Milhomen e ainda Gabriel (lotado em Ponta Grossa-PR); e o escrivão Mário Nunes (lotado em Florianópolis – SC).
A duvida é se eles irão confirmar a relação de proximidade que tiveram com a contadora. Mas ela dispõe de diversos e-mails e outros tipos de mensagens que trocou, em especial com o delegado Marcio Anselmo Adriano e o agente Rodrigo Prado, que mostram seus laços com a Força Tarefa.
No caso de Marcio Anselmo, uma relação mais intima em que ambos trocaram mensagens até quando ele estava de férias na Europa.
Além das mensagens há também cerca de 40 depoimentos delas em inquéritos e outros em processos judiciais, uma vez que, como ela já disse, Moro lhe pediu que se tornasse testemunha do juízo.
Não há nem como acusar Meire de levantar estas irregularidades contra a Lava Jato, que ela ajudou, em represália à denúncia pelo crime de lavagem de dinheiro junto com o ex-deputado André Vargas, o irmão dele, Leon Vargas, e o empresário Marcelo Simões, da IT7 Sistemas LTDA.
Como narramos, em 1º de junho de 2016, na postagem Enfim, a contadora e informante infiltrada da Lava Jato foi ouvida oficialmente, Meire oficializou suas queixas em 30 de maio de 2016, em um depoimento oficial ao procurador regional da República em São Paulo, Osório Barbosa. Na ocasião, estava acompanhada de um advogado do Instituto Brasileiros de Ciências Criminais (IBCCrim), Humberto Barrionuevo Fabretti, que lhe prestou assistência jurídica gratuitamente.
Ela foi levada ao procurador por esse Blog após confessar medo de atentarem contra si ou a filha. Meses antes, seu escritório, no bairro de Santo Amaro (SP) foi queimado em um ato que pode ter sido criminosamente provocado.
A contadora também se sentia desprezada e abandonada pela Força Tarefa da Lava Jato que, nas suas palavras, a fez de “informante infiltrada” e depois a descartou.
Até então, Meire temia que lhe processassem por ter vendido um imóvel que pertencia ao doleiro, já preso. O objetivo, como explicou, era arranjar verba para pagar as despesas da firma dele. O imóvel não foi confiscado judicialmente por não estar no nome de Youssef, mas de terceiros. A venda, segundo disse, foi do conhecimento/consentimento de delegados da Lava Jato, embora pudesse ser considerada ilegal. Não passava pela sua cabeça processo por lavagem de dinheiro.
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