Publicado no blog do Sidney Rezende
É compreensível que se tenha orgulho do trabalho bem feito. Isto vale para todos os setores. Fazer com paixão seu ofício é bom motivo para júbilo. É razoável até que se faça alguma publicidade quando o objetivo alcançado foi fruto do esforço diante do obstáculo alcançado. No entanto, quando o que seria legítimo dá lugar à vaidade vulgar, à soberba, à galhofa e à fanfarronice, logo se avizinha o desastre sob todos os aspectos. Temos uma história que ilustra bem a tragédia do excesso.
A delinquência é uma lástima, concordamos. O crime é coibido para que se chegue mais rápido ao convívio civilizatório entre as pessoas. A segurança pública é princípio básico para que os mais fortes e armados não imponham sua superioridade diante dos ditos mais fracos e menos poderosos. O respeito ao direito humano de viver se contrapõe à prática comum do bandido subjugar o lado mais frágil da sociedade. É comum se pisar no pescoço dos pobres.
Dito isto, criminosos não são artistas que devamos ter orgulho, celebridades que abrilhantam e valorizam nossas redes sociais, referências que nos inspiram. Negativo. Aqueles que matam, roubam, agridem, aleijam e humilham famílias, às vezes comunidades inteiras, precisam ser detidos em nome da justiça. Polícia para quem precisa de polícia.
A liberdade é atacada quando alguém estupra, esfola, julga e mata inocentes. Isto é um crime, muitas vezes hediondo.
A prisão do chefe do tráfico da Rocinha, Rogério 157, se enquadra no que escrevemos nas primeiras linhas: “trabalho bem feito”. Um esforço tremendo do pessoal da inteligência, equipe de segurança do Rio de Janeiro, que merece ser valorizado. Eis que, nem tudo é perfeito. E a lambança não demorou. Parte do grupo chefiado pelo delegado Gabriel Ferrando, titular da 12ª DP (Copacabana), que se empenhou em deter o traficante entendeu que – ao prendê-lo – era o momento de ter seus 15 minutos de fama e espocaram cliques e mais cliques, selfies e mais selfies com 157. Lamentável. Vergonha alheia.
Via-se o estarrecimento nos olhos de 157 sendo obrigado a posar ao lado de agentes. Ele parecia saber que era coadjuvante de um papel ridículo. Um escracho. As fotos já ganharam as variadas plataformas de comunicação do planeta. Não são o retrato do mundo moderno. É o registro da desordem, da falta de comando, da demonstração do desmoronamento da autoridade. Da bagunça institucionalizada, enfim.
A Corregedoria da Polícia Civil do Rio de Janeiro diz que abriu uma investigação interna sobre a conduta de agentes que celebraram estas selfies sorridentes após a ação na Favela do Arará, em Benfica. Dado o histórico do “vamos investigar”, “seremos rigorosos”, “vamos apurar”… fica difícil acreditar. Tudo indica que ninguém vai investigar nada, e, provavelmente, a aberração desta quarta (6) cairá no esquecimento já nos próximos dias.
Mas o caso estapafúrdio não para por aí. No mesmo dia, a polícia registrou queixa da senhora Naldo Benny, a ex-dançarina Ellen Cardoso, conhecida como Mulher Moranguinho. Ela denunciou o marido por agressão no domingo (3), quando informou também que ele tinha em casa uma arma não registrada.
Resultado, o artista foi preso por porte ilegal de arma nesta quarta-feira, depois que agentes da Deam encontraram uma pistola calibre 7,65 sem registro e munição em sua residência, no bairro da Freguesia, Zona Oeste do Rio. Benny foi levado à delegacia e autuado em flagrante. Foi liberado por volta de 15h20, após pagar fiança, e vai responder em liberdade por porte ilegal de arma, lesão corporal, ameaça e injúria.
O curiosíssimo episódio que se deu após tudo isso foi que Naldo realizou um show especial para os policiais. O clima foi de confraternização. Naldo fez o espetáculo, foi aplaudido, abraçado, louvado e elogiado com entusiasmo pelos canas e posou orgulhoso para selfies ao lado de quem deveria se dar o respeito. A Polícia do Rio não mede esforços ao surpreender os cidadãos de bem que torcem para o seu sucesso. Os policiais sérios, decentes, e não são poucos, devem estar envergonhados hoje. Que papelão!