Jovem Pan detona a bancada da bala da… Jovem Pan. Por Miguel Enriquez

Atualizado em 17 de fevereiro de 2018 às 2:22
Nikolas Crus se apresenta ao júri

POR MIGUEL ENRIQUEZ, de Brasília

As balas disparadas por um atirador solitário, que com seu fuzil AR-15 deixou um saldo de 17 mortos e 15 feridos numa escola de ensino médio de Parkland, uma pacata cidade de 30 mil habitantes da Flórida, na quarta feira, dia 14, ricochetearam na Jovem Pan, a emissora líder da cadeia radiofônica de extrema direita no país.

Indignado com o massacre, o historiador e comentarista Marco Antônio Villa apontou, no Jornal da Manhã, o carro-chefe do jornalismo da rádio, como principal causa do massacre a permissividade vigente nos Estados Unidos em relação à posse e porte de armas (https://www.youtube.com/watch?v=fby9G45CWpk&t=8469s, a partir de 2h19m).

De quebra, aproveitou para condenar os defensores do armamento da população no Brasil. “É bom lembrar que nos Estados Unidos você compra um fuzil, uma bazuca, pode fazer o que quiser”, afirmou. “E tem gente aqui no Brasil — e isso é que é pior –, gente que usa até microfone, que defende que vamos distribuir armas para proteger a população que está sendo atacada pela bandidagem.”

Depois de apresentar seu receituário para o problema da violência (Estado forte, Código Penal adequados e uma polícia devidamente adequada), Villa arrematou, referindo-se aos defensores da liberação das armas: “Gente que defende a distribuição de fuzil é gente desequilibrada.”

Caso tivesse ouvido o programa “Os Pingos nos Is”, que encerra a programação vespertina da Jovem Pan, no dia 13 de fevereiro, Villa descobriria que um desses desequilibrados a que se referia, estava a menos de dois metros de distância, no estúdio do Jornal da Manhã.

Naquela terça feira, a menos de 24 horas da tragédia de Parkland, Augusto Nunes e seu parceiro Felipe Moura Brasil, que conduzem Os Pingos nos Is, fizeram a apologia da posse generalizadas de armas, como um direito inalienável dos cidadãos brasileiros, ao comentarem um vídeo com entrevista do deputado Alberto Fraga (Democratas-DF), líder da chamada bancada da bala no Congresso (https://www.youtube.com/watch?v=v547oohguTs&t=3195s, a partir de 45m30).

Nele, o deputado, que já foi condenado a quatro anos de prisão pela posse ilegal de armas, preconizava uma maior flexibilização do Estatuto do Desarmamento, com a permissão, praticamente sem restrições, da posse de arma nos domicílios.

Nunes, inclusive, lembrou os resultados do plebiscito realizado em 2005, em sua cidade natal, Taquaritinga, no interior de São Paulo, em que “oitenta por cento votaram a favor do porte de armas”, afirmou. “Sempre tive e tenho arma, isso faz parte da liberdade individual.”

Esperto, Nunes, valentão quando se trata de caluniar mortos ou difamar e atacar mulheres (em especial a senadora paranaense Gleisi Hoffman, presidente do PT, como ele mesmo confessou ao final do Jornal da Manhã), amarelou, fugiu da bola dividida e resolveu esquecer o que havia afirmado dois dias antes e não encarar Villa.

Ao contrário, disparou uma platitude. “É incrível, é um fenômeno americano essa cultura da violência”, disse. Mais ou menos o que diria um torcedor de futebol, ao comentar o desempenho do português Cristiano Ronaldo na vitória do Real Madrid sobre o Paris Saint Germain, na tarde daquele mesmo dia. “O cara é foda, mesmo.”

Nunes e seu comparsa Moura Brasil poderiam alegar que o ataque perpetrado pelo jovem Nikolas Cruz na escola de Parkland, localizada a 70 quilômetros de Miami, numa região habitada por muitos imigrantes brasileiros, foi um tremendo azar.

Não foi: até o dia em que defenderam a liberação do armamento individual, já havia ocorrido nada menos de 17 tiroteios em escolas, neste ano, nos Estados Unidos, de acordo com a organização Everytown for Gun Safety. O episódio que atingiu a escola Marjory Stoneman Douglas foi o 18º.