As virtudes eternas do comedimento no emprego de adjetivos laudatórios.
Disse já várias vezes. Gosto de abrir Montaigne ao acaso, e ler ou reler alguns de seus ensaios.
A edição de papel — excelente, da série Os Pensadores, da Abril Cultural — sempre me acompanha. Deixei quase todos os meus livros em São Paulo, quando vim para Londres. Mas Os Ensaios estão aqui comigo. Vejo-os daqui, neste momento.
Baixei-os no iBooks, e outro dia li durante algum tempo digitalmente Montaigne, também ao acaso.
Dei num ensaio que todo jornalista deveria ler. Não apenas jornalista, mas quem quer que lide com palavras. Montaigne fala sobre o exagero no uso delas. Ele lembra que “divino” era um adjetivo que os gregos e depois a humanidade atribuíram a Platão. Muitos se referiam a ele como “o divino Platão”.
Platão é Platão. O adjetivo cai nele tão bem porque é fruto de um “consenso universal”, como diz Montaigne.
Ele se incomoda quando vê que os italianos estão usando a mesma palavra para definir um poeta nacional, Aretino. Ora, com todas as virtudes que o poeta italiano possa ter, Aretino é Aretino, não é Platão. “Salvo por algumas frases, não vejo nada nele que o distinga dos escritores comuns de seu tempo”, diz Montaigne. Montaigne nota também o grande número de reis aos quais foi anexada a palavra “grande”, sem que tenham nada de extraordinário.
Parcimônia nos adjetivos, sugere Montaigne.
Em meus dias de editor, era uma pregação constante minha. Como autor, é uma advertência que sempre faço a mim mesmo. Na condição de leitor, quando leio um artigo em que alguém é definido como um “gênio”, lembro imediatamente que gênio era Einstein.
Cuidado.
Quando usamos impropriamente um adjetivo louvador, não apenas não elevamos quem é alvo dele como rebaixamos a nós próprios.