Que Poder Judiciário é este que aceita a violação da Constituição? Por Afrânio Silva Jardim

Atualizado em 24 de junho de 2018 às 7:47

1) Como podem manter a prisão do ex-presidente Lula, se ela não é prevista no artigo 283 do Código de Processo Penal? Dispõe esta regra jurídica:

“Artigo 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória TRANSITADA EM JULGADO ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).”

Se este dispositivo é constitucional, NÃO PODE DEIXAR DE SER APLICADO PELO PODER JUDICIÁRIO !!!

2) Como podem manter a prisão do ex-presidente Lula, se ela é vedada pelo artigo 105 da Lei de Execução Penal, que exige o trânsito em julgado da condenação para o início da execução penal? Dispõe tal regra jurídica:

“Artigo 105. Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução”.

Se este dispositivo é constitucional, NÃO PODE DEIXAR DE SER APLICADO PELO PODER JUDICIÁRIO !!!

3) Como podem manter a prisão do ex-presidente Lula, se ela é incompatível com o disposto no artigo 5º, parágrafo LVII da nossa Constituição da República, que presume a inocência dos réus enquanto sua condenação não transitar em julgado? Vale dizer, como iniciar uma execução de uma pena de prisão, se o réu é tido como sendo inocente?

“Artigo 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
………………………………………………………………………………

LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;”

Como desconsiderar o que está expresso em nossa Lei Maior? Como não aplicar a Constituição da nossa República?

4) Explicando: Não há a menor dúvida de que, na doutrina e jurisprudência, o chamado “trânsito em julgado” ocorre quando determinada decisão judicial não pode ser mais impugnada por algum recurso processual. Vale dizer, se ainda pode caber algum recurso, a decisão não transitou em julgado e pode ser modificada no futuro.

5) Concluindo: Desta forma, não há “firulas jurídicas” que possam justificar a manutenção da prisão inconstitucional e ilegal do maior líder popular de toda a história de nosso país.

A manutenção da prisão do ex-presidente Lula macula o nosso ordenamento jurídico.

Mais do que cinismo e hipocrisia, acho que é pura má-fé; é uma afronta clara e objetiva ao Estado Democrático de Direito, expressamente prometido em nossa Constituição Federal.

Enfim, ou se restabelece a ordem jurídica em nosso país, soltando todos os presos ilegais, que estão em cumprimento de pena antecipada, ou não mais se pode respeitar um Poder Judiciário que referenda prisões inconstitucionais e “vira as costas” ao primado da Justiça.

É uma verdadeira exigência da cidadania !!!

Vejam o que disse o Ministro Marco Aurélio sobre tudo isso. Matéria publicada no excelente site do D.C.M. Para ter acesso, clique aqui.

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Afranio Silva Jardim, professor associado de Direito Processual Penal da Uerj. Mestre e Livre-Docente em Direito Processual Penal pela Uerj.