Existe um consenso no meio jurídico que diz que nem tudo que é legal é, necessariamente, legítimo.
No Brasil, então, em que leis são forjadas nos caldeirões do arbítrio e os operadores do direito exercem seu poder sob o manto do escárnio, as exceções passam-se às regras.
Mas, para além dessa lógica, nessa terra bananeira conseguiram fazer da legalidade não só uma fonte de ilegitimidade, mas, sobretudo, de mero cobertor para a fraude, para a mentira e para a manipulação.
Nesse universo de hipocrisia, talvez não exista exemplo maior do que o voto do ministro Edson Fachin no TSE.
Única voz dissonante à turba que impediu a candidatura do ex-presidente Lula, a encenação de um discurso legal, legítimo e garantista não resistiu à sua primeira prova.
Desmentindo uma tese de própria lavra que deveria entrar para os anais da defesa constitucional aos tratados internacionais, Fachin provou, por ele mesmo, que sua participação no julgamento que decidiu o destino da chapa Lula/Haddad não passou de um mero ato de uma grande encenação teatral.
Ao negar o recurso da defesa no STF que tinha como base os mesmíssimos argumentos levantados pelo seu voto no TSE, o eminente ministro nos afirma que uma coisa é a lei, outra coisa muito diferente é a necessidade de se ter o líder absoluto nas pesquisas fora da disputa.
Como se vê, na mesma medida em que a galhofa deu ares de legalidade e pluralidade a um julgamento previamente decidido, o desprezo pela coerência cuidou de chancelar uma injustiça.
São as novas faces no normal constitucional de um país arrasado por um sucessivo desenrolar de golpes institucionais.
E, como uma mentira não resiste sem que outras mentiras a sustentem, a coisa descamba para os mais diversos instrumentos que deveriam estar a serviço da democracia.
A recente divulgação da meia pesquisa Ibope, contratada pelos “isentos” O Estado de S. Paulo e TV Globo, não deixa dúvidas.
Numa patacoada que entrará para a história das pesquisas eleitorais, o instituto de pesquisas resolveu sabotar os próprios métodos para que o óbvio não fosse mais uma vez exposto ao povo brasileiro.
Após registrar no TSE a forma e abrangência da pesquisa que realizaria, alega ter mudado seu questionário “em atenção” à decisão do TSE que declarada e sabidamente seria contestada pela defesa de Lula.
Por ter negado sua própria metodologia e, por isso mesmo, ter em mãos um resultado que flagrantemente não condiz com o cenário real, recorreu, sob pena de ser completamente desmoralizado, à mais uma encenação legalista de consulta ao órgão eleitoral nacional.
De tão estapafúrdio, o ministro do TSE, Luis Felipe Salomão, rejeitou o questionamento e deixou a “dúvida” do instituto sem resposta.
Cumpridos os trâmites teatrais, divulgou ainda na noite dessa quarta (5) o resultado de uma pesquisa que diz uma coisa quando na verdade se refere a outra.
Chega a ser primário imaginar que os números apresentados pelo Ibope, a partir de uma pesquisa realizada dessa maneira, traz alguma novidade que não seja as já apresentadas nos cenários em que o nome de Lula foi substituído pelo de Haddad sem, no entanto, o ter sido apresentado como o seu indicado direto.
Basta comparar os números com os da pesquisa anterior do Ibope nesse mesmo cenário. Praticamente tudo dentro da margem de erro, nada de novo surgiu sob o sol. O que, na verdade, reflete basicamente mais um fracasso nos seus intentos.
Fora tudo, o Ibope tem pleno conhecimento do que fez, por que fez e para quem fez.
A questão aqui se limita, portanto, a saber diferir, com serenidade e responsabilidade, em que de fato se traduz a vontade expressa e soberana do povo inúmeras vezes já atestada por esses mesmo institutos e o que de fato se apresenta melancolicamente como mais um subproduto de uma eleição que se produz sob o signo da farsa.
No fim dessa história, não há o que comemorar por ninguém, seja você candidato ou eleitor. Por interesses impublicáveis, fomos todos feitos de idiotas.