A atriz mais nova a ser indicada ao Oscar e a mais velha têm mais em comum do que se haveria de esperar.
As duas grandes atuações de 2012 são de Emanuelle Riva e Quvenzhané Walis. Separadas por dois mundos e 77 anos de diferença, são o maior sinal de frescor no cinema atual. Emanuelle é a atriz mais velha a ser indicada ao Oscar. Quvenzhané é a mais nova.
Riva está esplendorosa como Anne em Amour, uma obra-prima de coragem, delicadeza e inteligência. Anne é uma professora de música que passa pelo calvário da senilidade com seu marido Georges (Jean Louis Trintignant). Na mão de um diretor meia-boca ou da Globo, seria um dramalhão insuportável (pensando na hipótese absolutamente improvável de uma história como essa ser feita ali).
Ela surgiu com Hiroshima Mon Amour, clássico da Nouvelle Vague de 1959. Não fez nada de memorável depois por causa de sua exigência. Dedicou-se ao teatro. Topou Amour por causa do papel, pelo diretor Michael Haneke e por Trintignant. Mora no mesmo apartamento em Paris há 50 anos, com pinturas de seu gato Titine, já falecido. Não tinge o cabelo, não fez plástica (pense em Danuza Leão. É o oposto). Não fala na palavra carreira quando se refere ao seu trabalho. Não mente ou esconde a idade. “Eu nunca quis ser uma estrela”, ela disse. “Eu tentei fazer coisas que me agradassem. É horrível ver atores se repetindo o tempo todo”.
Recusou-se a fazer qualquer papel. “Declinei muitas ofertas comerciais. Mas eu acho que estava errada, fui muito radical”. Vive sem celular ou televisão e diz que pretende continuar sendo uma pessoa comum. Como se atores não fossem pessoas comuns — mas o planeta que os colegas dela habitam não costuma ter lugar para esse tipo de gente. Muito menos para velhos.
Como Emanuelle, a pequena Quvenzhané Walis, de 9 anos, é um personagem um tanto improvável no mundo de fantasia de Hollywood. Com seu nome impronunciável, está um assombro em Indomável Sonhadora, uma fábula sobre um grupo de favelados americanos (sim, isso existe). Ela é Hushpuppy, às voltas com um pai atormentado e doente, que tenta dar uma criação consistente à filha em seus últimos anos de vida. É triste, lindo e original. A imagem da menina tentando sobreviver pescando peixes estranhos é enternecedora e dramática.
Quvenzhané nunca havia atuado anteriormente, não assiste TV e não conhece a maioria dos seus colegas e seus egos hipertrofiados. A família é da Louisianna. Seu nome é uma combinação do nome dos pais (Qulyndreia e Venjie); zhane quer dizer “fada” em swahili. O filme ganhou alguns prêmios e ela subiu ao palco para recebê-los. Mas sua preocupação era outra. “Eu pego o prêmio e penso: legal. E então volto a fazer o que estava fazendo”, disse.
Vai fazer o papel de Annie na nova versão para o cinema. É a mais nova de quatro crianças de um casal formado por uma professora e um motorista de caminhão. Nas viagens de promoção do filme, o pai ficou em casa com os outros filhos. “Eu sou apenas normal”, afirmou. “Estou sempre brigando com meus irmãos e provocando o cachorro que fica em casa”.
Há um oceano de tempo e distância entre as duas atrizes. Mas elas têm muito mais em comum do que se poderia pensar.