Diretor da Piauí transforma Merval em pó. Por Fernando Brito

Atualizado em 21 de setembro de 2018 às 19:51
Eles

Publicado no Tijolaço

POR FERNANDO BRITO

A elegância de quem desanca a estupidez torna mais cortante o fio da verdade.

Fernando Barros e Silva, (ex-Folha e hoje na Piauí) disseca hoje em artigo para a edição eletrônica da revista, a fúria de Merval Pereira contra Fernando Haddad, Lula e o PT.

Não fica pedra sobre pedra.

Transcrevo a parte final do texto, na íntegra aqui:

“As pesquisas eleitorais deixaram o colunista de O Globo de bigodes eriçados. Ontem, dia 20, ele publicou no jornal um artigo chamado “Um país congelado”. A imagem servia para introduzir a ideia de que estamos revivendo, quase trinta anos depois, a disputa entre Collor e Lula. Não é uma analogia propriamente ruim, mas também não nos leva muito longe. “Essa história já conhecemos, e termina mal”, escreve o imortal (sim, ele é membro da Academia Brasileira de Letras). A história, na verdade, terminou bem, porque o impeachment de Collor, em 1992, foi um marco do fortalecimento da democracia então incipiente no país. Justamente o contrário do que representou a destituição de Dilma Rousseff em 2016. Há mais uma diferença. Em 1989, o Grupo Globo apoiou Fernando Collor, sem muita preocupação de disfarçar isso. A Globo hoje não irá apoiar Bolsonaro (nem Haddad, obviamente). Algo, então, melhorou no país, não é mesmo?

Sigamos. “O Lula de 2018 está mais próximo do de 1989 do que daquele de 2002”, diz Merval. O leitor fica curioso diante de afirmação tão peremptória. O PT estaria tramando na surdina uma reforma agrária de feições bolivarianas? Estaria tentado a dar calotes nos credores do governo? A romper com os contratos? A transformar o Brasil num imenso Museu Nacional? A explicação mervalina vem algumas linhas adiante. Transcrevo o parágrafo na íntegra:

“O PT de Lula só quer saber de pacificação circunstancialmente, por pragmatismo eleitoral. Eleito, Haddad fará um governo na linha petista ditada por Lula, radical e antidemocrática. O PT de 2002 na verdade nunca existiu, era só uma fachada para o grupo político chegar ao poder e atravessar os primeiros anos sem turbulência.”

O que pensar dessas linhas tão criativas? Teria sido a coluna hackeada pelo general Hamilton Mourão? O autor desses disparates – chamemos as coisas pelo nome – é frequentemente apontado por colegas da imprensa como uma espécie de porta-voz dos patrões. Não acredito nisso. João Roberto Marinho transmite a sensação de ser uma pessoa sensata. Duvido que ele pense que o PT de 2002 na verdade nunca existiu.

Mais adiante, Merval volta a desabafar:

“Eleição estranha, com dois candidatos de campos antidemocráticos, e liderando com os índices de rejeição maiores do que as intenções de voto. Depois do mensalão e do petrolão, e da tentativa permanente de desacreditar, aqui e no exterior, nosso sistema judicial, fica muito difícil imaginar que o PT possa ser considerado um participante do campo democrático legítimo, da mesma forma como é difícil avaliar assim Bolsonaro, por seus atos e pelo que sugerem seus principais assessores.”

Recapitulando: na cabeça do imortal, o PT de 2002 não existiu, era só fachada, e o partido não pertence ao campo democrático legítimo. Lula e Bolsonaro se equivalem.

Não consigo evitar certo constrangimento diante da sensação de estar tomando o meu tempo e o tempo do leitor com um texto de opinião bastante medíocre, cujo autor oscila entre acessos apopléticos de indignação e reiterados engasgos de raciocínio. Por outro lado, não há como deixar de reconhecer que Merval Pereira é um bom termômetro da febre que acomete o país. Ele é o sintoma de algo que o ultrapassa. Ele é a prova viva e involuntária de que a democracia brasileira corre, sim, riscos de ir pelo ralo.”