Campanha de mentiras pelo “zap” quer te convencer que a ditadura não foi corrupta. Por Juca Guimarães

Atualizado em 19 de outubro de 2018 às 19:22
Militares

Publicado originalmente no Brasil de Fato

POR JUCA GUIMARÃES

Entre 1964 e 1985, o Brasil viveu um triste período sem democracia e liberdade sob o autoritarismo do regime militar. Por 20 anos, que ficaram conhecidos como “anos de chumbo”, o país se afundou em uma espiral de retrocessos.

Segundo um grupo de brasileiros conservadores investidos em reescrever a história, porém, a ditadura foi um período livre de corrupção e de grande crescimento econômico. A afirmação aparece em muitas notícias, correntes e textos compartilhados pelo WhatsApp, assim como uma onda de ataques ao Partido dos Trabalhadores.

Obviamente, essas afirmações não poderiam estar mais distantes da verdade. Os governos militares foram coniventes, consorciados e patrocinadores de inúmeros casos de corrupção, desvio de verba pública, privilégios e abusos de poder.

Considerando apenas os casos mais escabrosos, que conseguiram escapar da censura, e aqueles revelados durante o período pós-ditadura, é possível resgatar parte do histórico de corrupção nos anos de chumbo.

Como na época não havia eleições, os governadores e prefeitos das cidades maiores eram indicados pelos militares, chamados “biônicos”.

Entre os representantes escolhidos pelos militares que se envolveram em corrupção se destacam o caso do governador do Paraná, Haroldo Peres, que extorquia dinheiro de empreiteiros que tinham obras no Estado, e o Paulo Maluf, do governo de São Paulo, que autorizou empréstimos públicos para uma empresa da família.

Também é notório o caso do capitão Guimarães, um militar condecorado que tinha envolvimento com o contrabando no Rio de Janeiro, sem ser incomodado pela lei. Anos depois, o capitão se tornou um dos maiores bicheiros do país.

A corrupção dos militares também estava acima dos interesses patrióticos. Nos contratos com empresas internacionais foram registrados diversos casos de pagamento de propina, sobrando para o país o pagamento de contratos com preços superfaturados. É o caso, por exemplo, da aquisição dos trens da empresa federal de ferrovias.

“Em um regime militar, as instituições não são livres para investigar e denunciar. A Polícia Federal não vai investigar, claro, quem é que investiga uma tirania. A imprensa também não é livre para denunciar, para trazer esses escândalos a público. Temos várias pesquisas que apontam para experiências de corrupção durante o regime militar. Tem um lastro de bibliografias específicas que comprovam isso”, disse o historiador Rodrigo Perez, autor do livro ‘Conversas sobre o Brasil: ensaios da síntese histórica”, lançado em 2017.

Nos primeiros anos de golpe, os militares tentaram estabelecer uma imagem de gestão incorruptível e até criaram um instituto de investigação dos casos de enriquecimento ilícito. Porém, na prática, o órgão foi pouco efetivo, prevalecendo o corporativismo militar.

Dos processos de investigação do órgão regulador de corrupção do regime militar, o índice de arquivamentos sem conclusão da apuração foi de 86,7%. Dos casos investigados até o final, apenas 3,5% resultou em confisco de dinheiro ou bens indevidos.

“Com a questão da redemocratização, da forma como foi efetuada, não se contou a história do que aconteceu no Brasil. Não se contou todas as atrocidades que cometeram contra as pessoas que lutaram pela democracia e que foram perseguidas, torturadas e desaparecidas. E muito menos se contou todo o processo de corrupção que aconteceu no Brasil”, afirmou Rogério Sottili, diretor-executivo do Instituto Vladmir Herzog.

De acordo com Sottili, a corrução na época da ditadura era muito maior porque os mecanismos de transparência nos atos do executivo só foram criados no governos democráticos. No governo Lula, por exemplo, foi criada a Controladoria Geral da União e  foram fortalecidos o Ministério Público e a Polícia Federal.