Desde que descobriram aqueles 24 mil reais na conta de Michelle Bolsonaro, ela desapareceu das manchetes. Parece que os roteiristas decidiram colocar na geladeira o seu personagem gasto.
Justo ela, que adorava aparecer como a persona altruísta e corajosa defensora da comunidade surda e que usa camisetas afrontosas – “se você falar nesse tom comigo, vamos ter problema”, em alusão à fala da juíza Carolina Lebbos para o ex-presidente Lula.
No início, a primeira-dama representava bem seu personagem.
Ensaiou construir uma imagem de quebra de protocolos, quando foi a primeira a traduzir o discurso de posse do marido para a língua brasileira de sinais. “Se Deus abençoasse meu marido, eu tinha que fazer algo por eles [surdos]”, disse à Record.
Sua imagem forjada de benevolência e ousadia era frágil, entretanto, e desmoronou tão rápido quanto tem desmoronado o governo de seu marido.
Desgastada sua imagem com o caso Queiroz – e pelas indicações de suas amigas profissionalmente inexperientes para secretarias em Ministérios -, agora ela só aparece como a esposa dedicada que penteia um marido na cama de um hospital.
O personagem de afronta e salvadora dos surdos e oprimidos desapareceu.
Trata-se de algo absolutamente natural no teatro político: personagens aparecem e desaparecem o tempo todo, conforme a própria conveniência – vejamos, por exemplo, Sergio Moro e seu voto de silêncio recompensado por um Ministério.
A dinâmica das personagens construídas em torno das primeiras-damas é, entretanto, peculiar: Sergio Moro ganhou um Ministério por seu silêncio. Cada filho tem direito a uma teta na mamata que nunca termina. E para Michelle sobra uma vida luxuosa e protecionistapela qual paga o preço de continuar representando o personagem que inventaram pra ela, seja para aparecer, seja para desaparecer – no jogo político, ela não tem interesses próprios.
Mulheres, para essa gente, são fraquejadas. Café-com-leite. As que penteiam seus maridos, falam quando eles querem e calam-se quando eles mandam.
Assim como Marcela Temer, Michelle serviu ao governo do marido como parte da construção de sua imagem. Ambas foram rapidamente desgastadas e descartadas, embora por diferentes razões: Marcelinha, quando virou alvo de chacota bela, recatada e do lar, e Michelle, quando surgiu metida até o pescoço nas laranjadas do marido.
Marcela já cumpriu seu papel no espetáculo do absurdo, mas Michele deve ressurgir em breve, assim que seus marionetistas tiverem uma ideia tão brilhante quanto uma camiseta cafona.