Se o ritmo atual é de tragédias diárias, então vamos lá pois só ontem foram pelo menos duas:
Depois de entrar na CCJ com um coldre na cintura e fazer arminha com os dedos, Delegado Waldir, líder do partido de Jair Bolsonaro (PSL), defendeu ontem que crianças comecem a trabalhar a partir dos 12 anos de idade.
Foi na audiência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, com a ilustre presença de Damares Alves, que Delegado Waldir apresentou sua brilhante solução para reduzir as taxas de mortalidade entre jovens.
“Estamos tendo muita morte de adolescentes e crianças. Eles precisam trabalhar. Adolescentes a partir de 12 anos precisam ter uma atividade profissional”, disse ele.
O que uma coisa tem a ver com outra é algo que me escapa, mas essas pessoas são especialistas em vociferar cretinices. Bolsonaro também já desfilou seus conhecimentos sobre mortalidade infantil há algum tempo.
Antes de mais nada, o Delegado precisa ter em mente que jovens só podem trabalhar a partir dos 14 anos e na condição de aprendiz, segundo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Trabalho registrado só depois dos 16 anos. Então o nobre líder da bancada maluca deve saber que não se muda isso do dia para a noite, menos ainda por opinião particular dele.
Se a intenção foi de relacionar o número de mortes com a ociosidade e a tentação do tráfico, aí então que nada melhor do que estar na escola em vez de estar nas ruas.
Mas aí tivemos a segunda notícia desastrosa do dia, emitida por outro governo alinhado a Bolsonaro.
O governo de Minas Gerais anunciou que mais de mil escolas (isso, mil, 1.000 !!) que adotam o modelo de ensino integral deixarão de fazê-lo. Eram 1.600 escolas no estado, serão apenas 500. Eram 111 mil estudantes atendidos, serão apenas 30 mil.
O anúncio oficial foi feito na Assembleia Legislativa de Minas Gerais na tarde de ontem pela secretária de Educação, Julia Sant’Anna.
O governador mineiro Romeu Zema (Novo) é mais um que se elegeu na esteira do bolsonarismo. Ele, João Doria, Witzel… Uma turma em total alinhamento com o plano de manter uma mão de obra burra e barata no país.
Cortam cultura, cortam saúde, cortam escolas, cortam merendas. Sem qualificação nem direitos mínimos assegurados, quanto antes os jovens começarem a trabalhar, melhor. Aceitarão merreca de salário.
Num governo em que todo mundo fala e escreve errado, que comete verdadeiros massacres ao idioma, que demonstra ignorância completa sobre assuntos elementares como a esfericidade do planeta ou o aquecimento global, Delegado Waldir seria apenas mais um aparvalhado.
Enquanto está elogiando o vídeo de golden shower divulgado por Bolsonaro ou tendo problemas com a gengiva e as narinas ao ser confrontado pela deputada Sâmia Bonfim, fica confirmado.
Mas é um perigo.
Propostas indecorosas como a dele muitas vezes parecem dignas de desconsideração, tamanha parvoíce. Mas por vezes ganham corpo e, associadas a outras medidas concretas como a do governador mineiro, jogam o futuro dos jovens (e do país) no abismo.
O governo Bolsonaro é composto de anti-intelectualismo. O presidente já afirmou não compreender a “tara” que os jovens têm em formação superior e seus ministros se empenham em excluir as camadas menos favorecidas do acesso ao ensino.
A Nova Era está no período pré-industrial e quer perpetuar a vocação extrativista.