Querida @zdoficial. Ñ quero censura.
Usei meio legal p/assegurar integridade física e dignidade, pois ñ me sinto segura c/tudo isso. Sou um ser humano. Mereço respeito como todos. Sou tb uma parlamentar p/direitos humanos. É preciso resistir antes q nos desumanizem e exterminem? https://t.co/7A5HLCK0VC— Maria do Rosário (@mariadorosario) April 12, 2019
É inacreditável que parte da esquerda se preste ao papel lamentável de defender Danilo Gentili no caso da condenação pelas injúrias a Maria do Rosário, supostamente em nome da liberdade de expressão.
Duvivier, por exemplo, escreveu no Twitter: “Punitivismo jamais. Cadeias já tão lotadas de inocentes. Liberdade pra todos os q n põem em risco a vida de ngm. Lula, Danilo, NemDaRocinha.”
Danilo Gentili, Nem da Rocinha e Lula no mesmo balaio: vivi pra ver.
Pior ainda é confundir justiça com punitivismo.
Punitivismo é o encarceramento em massa dos pretos no Brasil – aí muito bem representados por Nem da Rocinha, jamais por Gentili.
Punitivismo é o que se faz com as mulheres que ousam exercerem autonomia sobre seus corpos. Punitivismo é o que sente na pele a mídia alternativa de modo geral, que tem sofrido cada vez mais processos por fazer oposição política através da comunicação.
Gentili nem sequer foi ou será preso. Sua condenação não é punitivismo, é justiça. Ele cometeu um crime e pagará por isso. Está na Código Penal.
O limite entre liberdade de expressão e barbárie é difícil de identificar. Um juiz certa vez usou a seguinte analogia: se alguém grita “fogo!” em um cinema, mesmo não havendo fogo nenhum, isso não é liberdade de expressão, porque causa injustamente prejuízos a outras pessoas.
Defender a liberdade de expressão é imprescindível – sobretudo no Brasil desses dias – mas defender a liberdade de expressão sem a observância dos limites da civilidade é defender o caos. Não é valor absoluto.
Gentili tem liberdade para dizer o que pensa, mas não para deliberadamente atacar outras pessoas, e muito me espanta que gente inteligente não enxergue isso.
As “piadas” de Gentili não puseram em risco a vida de ninguém, mas ofenderam e desumanizaram uma mulher, que já é tão frequentemente ofendida e desumanizada.
Aliás, puseram, sim: a doadora de leite humilhada por ele contou que pensou “vária vezes” em se matar.
A pressão à esquerda foi tanta que Maria do Rosário precisou justificar o óbvio em suas redes sociais: “Mereço respeito como todos”, escreveu no Twitter, em resposta a Zélia Duncan, que classificara a condenação de Gentili como “censura” (?)
Censura é o que fizeram ao QueerMuseu no ano passado. Censura foi o que aconteceu na exposição Literatura Exposta, no Rio, que usava um áudio do presidente Jair Bolsonaro com partes do discurso substituídos por uma receita de bolo em alusão à ditadura (mesmo anteriormente divulgado, o áudio foi proibido na exposição).
Censura é o que tem acontecido à arte marginal em geral no Brasil.
Liberdade de expressão é uma pauta importante e atualíssima sim. Ela corre riscos no Brasil atual, sim – por muitas razões, mas não porque um humorista foi condenado por abuso moral a uma mulher.
Bolsonaro, por exemplo, processa algumas pessoas. Duvivier entre elas.
O que vocês estão fazendo é obrigar uma mulher a pedir desculpas por buscar justiça, por denunciar um abuso, por querer ser respeitada enquanto ser humano e enquanto parlamentar.
O que vocês estão fazendo é o que sempre fizeram do outro lado: punir as vítimas.
Pagar multa por xingar uma mulher não é censura, é justiça.
Mas em um país em que é tão raro que a justiça seja feita, as pessoas ficam espantadas quando isso enfim acontece.