POR VINÍCIUS SEGALLA
A cruzada jurisdicional de Olavo de Carvalho contra aqueles que o criticam não vai bem.
O guru de Jair Bolsonaro está processando, só contando ações abertas neste ano na Justiça de São Paulo, dez pessoas, entre jornalistas, artistas e professores universitários. Três desses processos já contaram com julgamentos decisivos, todos desfavoráveis a Olavo. O DCM mostrou nos links a seguir a primeira e a segunda derrota.
No início deste mês, uma terceira decisão contrária ao escritor teve lugar. Nas anteriores, os motivos foram a falta de urbanidade e respeito no linguajar da denúncia apresentada, em uma, e a total falta de cabimento jurídico aliada à completa ausência de provas ou indícios acompanhando a queixa, na outra.
Desta vez, o processo foi extinto porque Olavo deixou de pagar as taxas legais obrigatórias na Justiça, no valor de R$ 1.326. Seu advogado chegou a pedir mais prazo por duas vezes, só para não cumpri-los novamente, até que a Justiça extinguiu o processo.
Fato é, no entanto, que mesmo que tivesse o dinheiro disponível para o pagamento, dificilmente sua queixa-crime por injúria e difamação teria prosperado.
Era uma queixa contra uma servidora que o teria ofendido por meio de uma publicação em suas redes sociais, que teria sido acompanhada por um link para uma outra publicação, que também seria ofensiva a Olavo.
Esta é a Folha 11 da ação que Olavo de Carvalho movia contra a servidora Anna Cassia Passacarelli (acima). Mas a queixa-crime – ao que tudo indica, por lapso do advogado – sequer traz a suposta reportagem linkada, nem o endereço da publicação na internet a que se refere.
Traz somente a publicação acima como pretensa prova dos crimes que acusa. Isso é tudo que consta em termos de injúria e calúnia pretensamente proferidas pela acusada.
E o processo trazia a acusação dos mesmos crimes (injúria e calúnia) pelos quais foi condenado em primeira instância o humorista Danilo Gentili, que chamou Maria do Rosário de “puta” e disse que ela deveria “enfiar um documento na bunda”.
Todo o resto é cópia das outras nove ações penais que move somente em São Paulo contra quem lhe profere críticas. Na presente ação, o advogado explicou por que estava sendo econômico nas provas:
Ou seja: Olavo pediu a condenação por crime punível com prisão de uma servidora pública por algo que sequer se dignificou a explicar direito à Justiça o que era, dando apenas “uma síntese do necessário”. Ainda aproveitou para chamar a acusada de “esta desqualificada, militante, ou incauta, em tese”.
Foram exatamente essas duas características de suas ações penais recentemente rejeitadas pela Justiça que fizeram com que os processos não prosperassem: em uma delas, o juiz explicou que Olavo não poderia ofender àquele que tentava processar por uma ofensa.
Na outra, seu advogado ouviu que é preciso explicar em detalhes a conduta supostamente criminosa da pessoa a quem se recusa.
Assim, se estiver disposto a olhar a metade cheia do copo, Olavo deve ficar satisfeito. Economizou R$ 1.326.
O valor que não foi pago
O que Olavo de Carvalho não pagou foram as custas da chamada ação penal privada. Seu custo previsto em lei é de 50 Ufesps, Unidade Fiscal do Estado de São Paulo, que hoje vale R$ 26,53.
Como determina a norma legal, as custas devem ser recolhidas no momento da distribuição, ou, na falta desta, antes do despacho inicial do processo.
Quer dizer, assim que o escritor apresentou sua queixa ao Judiciário, deveria ter protocolado o comprovante de pagamento pelo acionamento da Justiça (quem não possui recursos mínimos para mover uma ação penal pode peticionar pela justiça gratuita, mas não foi o caso de Olavo).
Bom, o escritor ofertou sua queixa-crime no dia 18 de fevereiro deste ano. Nove dias depois, sem notícia do pagamento devido e sem ter recebido qualquer pedido de justiça gratuita, o juiz Claudio Juliano Filho, da 13ª Vara Criminal do Fórum da Barra Funda, cobrou a parte acusadora pela primeira vez:
“Intime-se a defesa do querelante para promover o recolhimento das custas iniciais no prazo de 05 (cinco) dias sob pena de rejeição da queixa-crime.
Com a devida comprovação, tornem conclusos os autos para posterior deliberação.
São Paulo, 27 de fevereiro de 2019.”
No dia 5 de março, o advogado de Olavo de Carvalho se pronunciou. Alegou que não tinha pago as custas, mas que poderia pagar dentro de mais cinco dias. Para justificar o atraso, alegou problemas de instabilidade no site da Justiça, graças às quais não teria sido possível emitir a guia oficial de pagamento.
A Justiça só foi responder dois dias depois, concedendo mais cinco para que Olavo pudesse pagar e continuar com seu processo.
“Defiro prazo suplementar de 05 (cinco) dias pleiteado pelo querelante.
Intimem-se.
São Paulo, 07 de março de 2019.”
Olavo de Carvalho só voltou a se manifestar no processo dez dias depois, para dizer que não estava conseguindo emitir a “guia filhote”, e que portanto precisava de mais cinco dias, aproveitando para saudar os servidores do Judiciário:
“Em atenção ao r. despacho proferido por Vossa Excelência, o AUTOR, agradece e, data vênia, pugna por mais 5 (cinco) dias, a contar do deferimento, para o efetivo recolhimento das guias, pois o sistema do TJ/SP, não esta (SIC) gerando a guia filhote, tendo este causídico que procurar outras vias licitas (SIC) para o regular andamento do feito e juntar as guias.
Sem mais para o momento, meus sinceros e protestos (SIC) de eleva (SIC) estima a todos os zelosos funcionários desta e. vara em comento.”
Desta feita, a Justiça levou apenas um dia para se pronunciar.
“Juiz(a) de Direito: Dr(a).JOSE FABIANO CAMBOIM DE LIMA
Defiro prazo suplementar de 05 (cinco) dias pleiteado pelo querelante.
Intimem-se.
São Paulo, 18 de março de 2019.”
Então, a Justiça esperou não cinco, mas 13 dias mais, sem que Olavo pagasse o valor devido nem fizesse novo pedido de prazo, para encerrar o caso ali mesmo, por falta de pagamento.
“A rejeição da presente queixa-crime impõe-se como medida de rigor.
Isto porque o querelante deixou de recolher as custas iniciais, apesar de intimado. Ademais, posteriormente foi deferido prazo suplementar para o recolhimento das custas, no entanto, decorrido o prazo, não houve manifestação da defesa.
Ante o exposto JULGO EXTINTA A PRESENTE QUEIXA CRIME.
São Paulo, 03 de abril de 2019.”