No Senado, Moro não respondeu à pergunta sobre a ligação da esposa, Rosângela, com a indústria da delação

Atualizado em 19 de junho de 2019 às 16:24
“Tacla Durán, aqui, não”

O senador Rogério Carvalho, do PT de Sergipe, perguntou, objetivamente, a Sergio Moro se a esposa dele, Rosângela, trabalhou com algum advogado que fez acordo de delação premiada na Lava Jato.

Moro não respondeu, porque, se respondesse, teria de dizer sim. Ou teria de mentir.

Rosângela Moro foi advogada no caso da falência da GVA, fábrica de madeirit em Guarapuava, Paraná.

Quem comandava a assessoria jurídica da massa falida era Marlus Arns, que mais tarde, no auge da Lava Jato, fecharia os acordos de colaboração de Dalton Avancini e Eduardo Leite, da Camargo Corrêa, e do empresário João Bernardi Filho.

Delações que foram homologadas por Sergio Moro.

No livro “Poder, Dinheiro e Corrupção – Os Bastidores da CPI das Falências”, o então deputado Fábio Camargo, que presidiu a CPI, descreveu assim o esquema do qual fez parte Marlus Arns e ao qual Rosângela Moro prestou serviço:

“Não era um esquema qualquer. Fosse um esquema montado com o fim exclusivo de fraudar os juízes e o Judiciário, um esquema ‘de fora para dentro’, ele já teria sido desmantelado. Ficou claro para mim, cada vez mais, que o esquema é de ‘dentro para fora’, ou seja, os operadores reais estão dentro das entranhas do TJPR.”

Moro nunca foi do Tribunal de Justiça do Paraná, mas, durante a Lava Jato, o que se observou é que apenas um seleto grupo de advogados fechava os acordos de delação.

Sempre pareceu que eram escolhidos de dentro para fora, como no caso da máfia das falências.

É verdade que, no caso da delação, é o Ministério Público quem faz o acordo, mas ele não tem validade se o magistrado não homologar. Portanto, pelo que parece, se o advogado não for amigo do rei ou dos príncipes, não terá chance alguma.

Marlus foi formalmente advogado naqueles acordos de delação, mas outro ex-sócio de Rosângela, Carlos Zucolotto Júnior, atuou informalmente em pelo menos uma tentativa de acordo, segundo denúncia do advogado Rodrigo Tacla Durán.

Esse advogado, acusado de lavagem de dinheiro pelo MP, denunciou Zucolotto Júnior e apresentou cópia periciada de uma conversa indevida, reveladora de crime.

Zucolotto Júnior, que foi padrinho de casamento de Moro e de Rosângela, aparece nessas conversas por aplicativo de celular negociando facilidade no acordo, em troca de um pagamento por fora de 5 milhões de dólares.

Tacla Durán fez a denúncia em meados de 2017. Mais tarde, em entrevista ao DCM, ele deu outras informações e, nesta semana, contou, em entrevista a Jamil Chade, do UOL, como a história teve sequência.

Segundo ele, depois desse contato de Zucolollo, entrou em ação Marlus Arns, que esteve com Tacla Durán nos Estados Unidos, onde ele morava, e acertou o recebimento de 612 mil dólares, como parte do pagamento dos 5 milhões.

O ex-advogado da Odebrecht tem o comprovante da transferência bancária, bem como um contrato paga pagamento de honorários. Mas não há nenhum evento de trabalho, bem como procuração em nenhum processo de Tacla Durán.

Se não há trabalho, por que Tacla Durán pagou o equivalente a 2,4 milhões de reais?

“Paguei para não ser preso”, disse.

O senador Jean Paul Prates, do PT do Rio Grande do Norte, questionou Moro sobre essa denúncia de Tacla Durán. O ex-juiz, como fez na ocasião em que o caso começou a vir à tona, atacou aquele a quem deveria julgar, com imparcialidade.

“Em relação a esse indivíduo que o senhor mencionou, o tal do Tacla Durán, isso é uma história requentada, isso aí saiu lá em 2017, é uma história estapafúrdia”, afirmou.

Em seguida, sem tê-lo ouvido uma única vez e, portanto, sem tê-lo julgado, condenou:

“Essa pessoa é um lavador profissional de dinheiro, que está foragido do país, que saiu do país para escapar do processo, basicamente é isso. Não tem nada em relação a essa pessoa, salvo fantasia de um criminoso querendo atacar o juízo, os investidores.”

Foi por conta desse pré-julgamento, exposto num programa de televisão, é que Moro foi considerado um juiz parcial, suspeito, indigno de crédito no que se refere à ordem de prisão que assinou.

Nem as autoridades americanas cumpriram esse mandando, nem a Interpol, que mandou retirar o nome de Tacla Durán do alerta vermelho depois que julgou um pedido dele, com base no que disse Moro ao programa Roda Viva, da TV Cultura.

O senador Prates poderia ter aprofundado essa questão se tocasse em três pontos:

Por que Moro condena Tacla Durán sem tê-lo ouvido?

Por que Moro se irrita tanto com a história se Tacla Durán nunca disse que ele está envolvido nesse esquema de extorsão?

Por que Moro defende Zucolotto e Marlus Arns?

Se Moro quisesse, poderia ter determinado a investigação da denúncia de Tacla Durán na época, e também agora. Afinal, não é incomum que uma pessoa use o nome de autoridades para poder obter vantagens indevidas.

Além disso, a denúncia de Tacla Durán sobre Marlus Arns não é requentada. É pura novidade, e Tacla Durán tem documentos que comprovam a transferência de dinheiro.

É uma denúncia com provas.

Por que Moro tem tanto medo dessa história?

Marlus Arns

 

 

 

 

 

 

Ao portifólio particular de Rosângela, podem-se acrescentar serviços prestados também à família Simão, apontada em uma CPI de 2011 como integrante da Máfia das Falências do Estado, uma organização que se desenvolveu no seio do Poder Judiciário do Paraná.

Quem estava na linha de frente da defesa da família Simão é Marlus Arns, sobrinho do ex-vice-governador Flávio. A mulher de Moro também aparece como advogada de uma das massas falidas administradas pela família Simão, só que com menor destaque do que Marlus. É a da GVA, fabricante das famosas placas madeirit.

A GVA, ao quebrar, deixou as páginas de economia para entrar nas de polícia.

O esquema da Máfia das Falências, revelado pela CPI, é engenhoso.

Pelas contas do então deputado estadual Fábio de Souza Camargo, presidente da CPI, pelo menos R$ 400 milhões foram desviados de empresas que quebraram e deveriam ser usados para o pagamento do Fisco, trabalhadores e credores.

A CPI foi encerrada antes do relatório por decisão da Justiça, mas Fábio e alguns deputados continuaram a investigar, com audiências públicas pelo interior do Estado, onde a máfia deixou rastro. Uma dessas audiências foi em Guarapuava, cidade da GVA. Marlus representou a família Simão.

“Era o Marlus que comandava toda a assessoria jurídica da família Simão, informou o sindicalista. Segundo a CPI, Marlus respondia ao mesmo tempo pela assistência jurídica da massa falida da GVA e também da Gran Comp Insumos e Compensações, uma das empresas que celebraram contrato de arrendamento da massa falida, a preço vil, segundo o deputado.

O conflito de interesses era evidente.