Publicado originalmente no Brasil de Fato:
Servidores públicos públicos de órgãos ambientais se tornaram alvos da administração de Jair Bolsonaro (PSL). No último domingo (25), a revista Globo Rural divulgou uma fala da pecuarista Nair Brizola, multada dez dias antes da publicação, que acusava servidores do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) de terem promovido os incêndios da Amazônia. A reportagem foi compartilhada pelo ministro Ricardo Salles (Novo).
Logo no início do governo, fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) na Amazônia também foram alvo de críticas do próprio Bolsonaro, ele mesmo multado, quando deputado federal, por pesca ilegal em Angra dos Reis. O servidor que o multou foi removido do cargo.
O caso mais recente ocorreu no aniversário de criação do ICMBio, que completou 12 anos na quarta-feira (28). Por volta das 8h30, cerca de 120 funcionários se reuniram na área externa da sede do órgão, em Brasília (DF). Cantaram o Hino Nacional e realizaram um café da manhã coletivo.
Às 9h20, um comunicado do presidente da instituição, o coronel da Polícia Militar de São Paulo Homero de Giorge Cerqueira, circulou afirmando que a manifestação não estava autorizada. Vinte minutos depois, conforme já estava previsto, a festa de aniversário do ICMBio, realizada oficialmente em anos anteriores, se encerrava.
“A gente utilizou a parte aberta, não usamos as instalações propriamente ditas do ICMBio. É um processo absolutamente democrático, amparado na Constituição. O presidente não está dialogando conosco, faz dias que nós pedimos uma reunião com ele. Há um ambiente de perseguição dos servidores”, relata Rogério Egewarth, integrante da diretoria da Associação Nacional de Servidores da Carreira de Especialista de Meio Ambiente (Ascema).
Elizabeth Uema, secretária-executiva da Ascema, diz que desde o início do governo as declarações e ações do Planalto e da direção do Ministério do Meio Ambiente vão no sentido de impor “mordaças” e de “atacar a autonomia” dos órgãos ambientais: “Ocorrem fatos de intimidação dos servidores, inclusive para coibir o exercício de suas atribuições, principalmente em relação à fiscalização”.
O coronel Cerqueira foi levado à direção do ICMBio por Salles, que atuou no governo do estado de São Paulo durante a gestão de Geraldo Alckmin (PSDB). Uema diz que a indicação de militares não deve se restringir ao topo da instituição.
“Muito recentemente o próprio diretor do ICMBio enviou uma mensagem para todos comandos das polícias militares demandando currículos para indicar pessoas para cargos de direção em unidades de conservação”, relata.
Alexandre Gontijo, presidente da Asibama-DF, recebeu um comunicado específico de Cerqueira informando a proibição da manifestação. Segundo ele, o café da manhã não tinha “intenção de afrontar”, mas a lógica militar tem dificultado a relação entre servidores e direção do órgão.
“Isso já vem de mais tempo. Já tiveram outras situações que caracterizam algum nível de perseguição, desde questões mais individualizadas, servidores sendo removidos sem justificativa. Eles [militares] têm regras e regimentos diferentes de instituições civis. Ele não entende que é direito dos servidores se organizarem e se reunirem”, defende.
Gontijo afirma que as declarações de autoridades contra servidores e órgãos distorcem a realidade, e que o trabalho dos funcionários é proteger o “patrimônio ambiental, que é resguardado pela Constituição”.
“Muitas vezes o governo tenta passar a ideia que os servidores agem por alguma ideologia. Nosso trabalho se pauta pela legislação ambiental e pelos dados técnico-científicos, que muitas vezes têm sido negados pela direção dos órgãos. Nos parece que a ideologia existe de cima para baixo”, critica.
O presidente do ICMBio chegou a postar uma mensagem no Instagram chamando de irresponsáveis os servidores que participaram do café da manhã, mas apagou a mensagem posteriormente. Por conta do contexto, os funcionários temem a possibilidade de retaliações por parte da direção.