O Tribunal de Contas Estado (TCE) de São Paulo suspendeu na última segunda-feira (14) a licitação que definiria a concessão de quatro novos presídios para a iniciativa privada. A suspensão foi baseada em ação civil movida pela Defensoria Pública do Estado, que pede a anulação do edital, sob a justificativa de que o poder público estaria delegando à iniciativa privada funções de polícia, que são exclusivas do Estado.
A licitação, marcada para ocorrer nesta quarta-feira (16), também havia sido suspensa pela Tribunal de Justiça (TJ-SP), na última sexta-feira (11). Porém, outro desembargador, também na segunda-feira, havia concedido liminar liberando o processo. No entanto, prevalece a decisão do TCE, que quer rever as condições do edital.
Também atuaram com a Defensoria o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), o Instituto Brasileiro Direito Constitucional (IBDC) e a organização de direitos humanos Conectas. Segundo o defensor Matheus Oliveira Moro, coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária, a privatização dos presídios defendida pelo governador João Doria (PSDB), além da questão jurídica, não atende aos interesses de melhoria dos serviços nem reduz despesas.
Ele destaca que o edital prevê que seriam atribuições da empresa contratada “garantir de forma constante o apoio à manutenção da ordem, à segurança e à disciplina”, “o monitoramento da movimentação das pessoas presas, adotando medidas que visem a segurança nas dependências do estabelecimentos, apoiando a manutenção da disciplina e prevenção de tumultos”, além da revista dos detentos, funcionários e visitantes. “Ainda que se tente dizer o contrário, o edital é muito claro no sentido do que o que está sendo delegado é o poder de polícia”, destaca o defensor em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, para o Jornal Brasil Atual, nesta quarta-feira (16).
Experiências mal-sucedidas no Amazonas e no Maranhão, onde ocorreram sucessivas chacinas em presídios controlados por empresas privadas também mostram que esse não é o caminho. Até mesmo nos Estados Unidos, a privatização dos presídios tem sido apontada como um dos fatores que contribuíram para a explosão dos índices de encarceramento nas últimas décadas.
Sobre a questão financeira, Moro diz que a própria Secretária de Administração Penitenciária estimou em que cada pessoa presa custaria pelo menos R$ 4.390 por mês no modelo privatizado, enquanto no sistema público cada detento custa ao estado R$ 1.580 por mês. “Nesse valor não está embutido ainda o custo do estado, que inclui o diretor da unidade, agentes penitenciários que ficam nas muralhas etc. Sendo audacioso, posso dizer que Doria estaria trazendo os quatro presídios mais caros do Brasil, e até mesmo da América do Sul.”
Além da função de polícia, o edital delega à empresa privada os serviços médicos, de psicologia e assistência social e serviços médicos. São esses profissionais que elaboram os chamados exames criminológicos, explica o defensor, que servem para fundamentar a decisão do juiz sobre processos de progressão de pena e liberdade, por exemplo. O risco, segundo ele é a influência do mercado para manter as pessoas presas, que em sua maioria são jovens, negros, pobres e com baixa escolaridade. “É a transformação desses corpos em mercadoria.”