Quem são e o querem os milicianos digitais de Bolsonaro: uma análise de quem pulou fora do barco. Por Pedro Zambarda

Atualizado em 2 de novembro de 2019 às 16:00
Luciano Ayan

Luciano Ayan, pseudônimo de Carlos Augusto de Moraes Afonso, o dono do site Ceticismo Político, deu entrevista ao DCM em que confessa que se arrependeu de ter se aproximado da rede de fake news e da extrema direita que colocou Bolsonaro no poder. Ativo na internet desde 2004, ele analisou a ação dos bolsonaristas na internet.

Para Ayan, as redes de linchamento do bolsonarismo refletem uma visão antissocial e têm uma conexão, em que uma mensagem é propagada como se fosse o estouro de uma boiada.

A rede é dividida em pelo menos cinco partes.

Os influenciadores são Olavo de Carvalho, Allan dos Santos, Fernanda Salles, Flavio Morgenstern, Italo Lorenzon, Leandro Ruschel, Claudia Wild, Silvio Grimaldo, Taiguara F. de Sousa, Eduardo Matos de Alencar, Alexandre Pacheco, Filipe Trielli, André Assi Barreto, Ricardo Roveran, Fernando Melo, Diego Garcia e Filipe Eduardo.

Há os defensores de cargos públicos, que incluem a família Bolsonaro. São eles Caroline de Toni, Gil Diniz, Helio Lopes, Carlos Jordy, Damares, Filipe Barros, Marcio Labre, Filipe G. Martins, Sara Winter, Steh Papaiano, Arthur Weintraub, Fabio Wajngarten, Onyx Lorenzoni, Abraham Weintraub, Roberto Alvim e Ernesto Araújo.

Eles não agem, necessariamente, por ideologia, mas para manter seus empregos.

Já os youtubers bolsonaristas agem, em princípio, pela busca de audiência, que acaba se convertendo em receita. São eles:  Bernardo Kuster, Daniel Lopez, Nando Moura, Lilo VLOG, Fábio ClickTime, Marcelo Brigadeiro, Fernando Melo e Paula Marisa, entre outros.

No Twitter, os perfis bolsonaristas são Isentões, Dona Regina, Tonho Drinks, O Ódio do Bem, Bolsonéas e Patriotas, entre outros.

Estes podem ser considerados “moderados”.

Perfis extremos promovem o linchamento e “terrorismo virtual”, na opinião de Luciano Ayan. São eles: Left Dex, Peruvian Bot e “Deja el Loen te lechar?”. Para ele, estes são a “boca do lixo” na internet.

A mídia bolsonarista ainda conta com o Crítica Nacional (de Paulo Enéas e Otávio Fakhoury), Renova Mídia, Conexão Política, Senso Incomum (onde no passado atuavam Felipe G. Martins e Flávio Morgenstern) e Terça Livre (do Allan dos Santos).

A pedido do DCM, Ayan desenvolveu suas análises sobre para esses grupos.

Os que mais postam

“Os influenciadores são aqueles que criam mais conteúdo. Praticamente tudo aquilo em que acreditam é ditado por Olavo de Carvalho lá da Virgínia”. 

Para Ayan, esses influenciadores devem ter objetivos emocionais ou busca de prestígio social em vez de recebimento financeiro. Ele não vê um objetivo comercial, e essas pessoas mostram discursos que geralmente são extremistas, puristas. “Eles acreditam na ‘direita verdadeira’ contra ‘os traidores’, sempre em tom quase infantil, mas eles levam a sério. São paranoicos e estão mergulhados em teorias da conspiração contra o Foro de São Paulo e o globalismo. Muitas vezes, eles pedem ‘ruptura’”, complementa.

Recentemente, em uma entrevista a Leda Nagle, o deputado Eduardo Bolsonaro defendeu o AI-5, que possibilitou a censura e a perseguição na ditadura militar. Os influenciadores ajudaram a propagar o discurso autoritário do 03 na internet.

Um grupo quer dinheiro e outro é menos controlável

Ayan acredita que existe um grupo de “defensores de cargos públicos”, o que inclui pessoas com cargo de gabinete, seja de deputados, senadores ou até ministérios.

“Ouve-se muito, nos corredores, que a ala sectária do PSL é a que mais utiliza cargos de gabinetes para acomodar pessoas dessa militância online”, explica.

Mas há um terceiro grupo, dos youtubers, que é menos “controlado” do que parece. “Observe, por exemplo, alguém como Nando Moura, que recentemente entrou numa baita confusão com olavistas como Allan dos Santos. Quer dizer: Moura, mesmo podendo ser considerado um bolsolavista, muitas vezes mostra ser mesmo independente. Em geral, nota-se o uso de teorias da conspiração, retórica delirante, pensamento associativo mágico e discurso purista. Alguns são até involuntariamente cômicos, como Fábio ClickTime, que, de vez em quando, diz que ‘provou ter razão’. Isso quando geralmente Olavo diz a mesma coisa que ele. Certo dia, ele chegou a dizer para Nando Moura: ‘Você vai ter coragem de ficar contra Olavo de Carvalho?’”.

Para ele, os youtubers parecem ser um grupo muito mais focado em moeda social, lucros em anúncio ou mesmo crença verdadeira do que ganho direto por parte do governo para dar sua opinião. 

Nando Moura. Foto: Reprodução/YouTube

Mídia bolsonarista e a “boca do lixo”

“As mídias bolsonaristas costumam ser comparadas às mídias petistas, mas isso é equivocado (ele citou o Brasil 247 e a Fórum). Esses órgãos possuem jornalistas profissionais. Já as mídias bolsonaristas não trazem jornalistas e normalmente parecem porta-vozes do governo, sem a menor sutileza”, resume Ayan.

Ele também falou sobre os perfis de extremistas no Twitter, como Isentões, Dona Regina, Tonho Drinks, O Ódio do Bem, Bolsonéas e Patriotas, além de Left Dex, Peruvian Bot e “Deja el Loen te lechar?”

“Não se sabe até que ponto eles são pagos ou não, mas alguns acabam com cargos em gabinete, como é o caso do perfil Bolsonéas. Mas, se seguirmos o padrão da alt-right, uma boa parte mesmo desses perfis não deve receber pagamento por isso. Eles se motivam pela retórica de ódio, discurso paranoico, isolamento, dependência/narcisismo de grupo e tendem a querer correr grandes riscos. Com perfis extremos, temos a boca do lixo das redes sociais. Muitos desses perfis são misóginos e atacam as mulheres das formas mais baixas. Algumas são chamadas de prostitutas, ridicularizadas em sua aparência. Algumas vezes há crimes claros, como difamações, falsificações de prints, entre outros”, explica.

“No geral, esse ecossistema é alimentado por uma usina de retuitagens, uma série de perfis falsos, centenas e até milhares de bots. Há os levantamentos estranhíssimos de hashtags. Uma investigação de redes deveria incluir esses perfis citados, pois há muitos indícios de comportamento artificial”, resume.

Apoio a Alexandre Frota e o livro

Luciano Ayan corcorda com a análise que o sociólogo Sérgio Amadeu, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil, fez em entrevista ao DCM sobre as milícias bolsonaristas. “A ideia da desinformação é o primeiro passo para que eles façam a destruição da comunicação, que é fundamental para a democracia”, disse Amadeu. 

Ayan está escrevendo um livro sobre seitas, e pesquisa os laços entre o bolsonarismo e o olavismo. Embora não tenha uma lista oficial dos milicianos de Bolsonaro, ele reuniu informações da rede social, inclusive o Twitter, e começou a ajudar novos opositores do governo.

“Tenho auxiliado várias pessoas vítimas de linchamentos e notei, ao longo do tempo, que Alexandre Frota comprou essa briga com mais intensidade do que os outros. É isso que está faltando: bater de frente com esses grupos, principalmente com os adeptos do anonimato, pois estes beiram o terrorismo virtual. Enviei para o Frota alguns dossiês relacionados a linchamentos virtuais, como o do general Mourão, Santos Cruz, Cassiano Tirapani e Rachel Sheherazade”, explicou.

No primeiro dia da CPI das Fake News, Alexandre Frota entregou um documento de 500 páginas, com muitos prints sobre a atuação dos milicianos digitais.

Embora Alexandre Frota tenha errado um dos perfis de Twitter de Olavo de Carvalho, Luciano Ayan avalia que ele se saiu bem.

É, em certa medida, um autoelogio, já que muitas das informações divulgadas pelo deputado saíram das pesquisas que ele fez na rede.

No bolsonarismo, os antigos aliados estão no octógono. De um lado, os que se agarram a cargos. De outro, os que ficaram sem cargos ou não ligam para eles — o que é raro.

Para o Brasil, o melhor é que lutem até o nocaute do adversário. Só assim se saberá a verdade.

Bolsonaro corre muito mais riscos com a mágoa de antigos amigos do que com a oposição dos adversários de sempre.

Eles sabem do que são capazes e o que fizeram na eleição passada.