PUBLICADO NO SUL21
POR SELVINO HECK
O LOMBA, ANO 2, MARÇO 1979, NÚMERO 15: “PRIMEIRO DE MAIO. Sindicatos, associações de bairros e Movimento Contra a Carestia estão organizando, em todo o Brasil, a campanha por um Primeiro de Maio de Luta. Até o Dia do Trabalhador serão feitas assembléias, reuniões, debates e outras programações, para discutir a situação do trabalhador, vendo também como fazer para continuar a luta por melhores salários e por melhores condições de trabalho.
As reivindicações principais são a de um salário mínimo unificado e da estabilidade nos empregos. O salário mínimo exigido é de Cr$ 8.144,00, que é a quantia necessária para que se possa comprar a ração alimentar básica, conforme cálculo de técnicos, feitos a pedido de diversos sindicatos. E a estabilidade nos empregos é a condição para que os trabalhadores possam ter um pouco de tranquilidade, sabendo que não podem ser despedidos sem mais nem menos.
A campanha é chamada de Primeiro Maio de Luta, para lembrar que o Dia do Trabalhador não é de festa, nem de discurso. O Dia do Trabalhador é dia de luta, pois comemora a campanha pela jornada de trabalho de oito horas, levada no século passado pelos trabalhadores de todo mundo. Lembra, também, os oito operários norte-americanos que morreram na forca, durante a campanha, porque lideravam as lutas dos trabalhadores.” (O LOMBA era o jornal mimeografado do movimento comunitário da Lomba do Pinheiro, periferia de Porto Alegre e Viamão, que começou a circular em setembro de 1977, vendido a Cr$ 2,00 nos mercadinhos e bares das comunidades.)
“CONFIDENCIAL. 0779. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. AGÊNCIA PORTO ALEGRE – PEDIDO DE BUSCA Número 00028/140/APA/89. DATA: 20 ABR 89. ASSUNTO: COMEMORAÇÕES DO DIA “DIA DO TRABALHO” – 01 MAI 89. ORIGEM: APA/SNI. DIFUSÃO: CMS – PM2/BM/RS.
- a) A cada ano, às vésperas das comemorações do “Dia do Trabalho” (01 MAI), as entidades sindicais e intersindicais noticiam a preparação de eventos alusivos à referida data, com destaque para a realização de diversos tipos de manifestações de protesto “contra a exploração salarial imposta pela classe patronal ao trabalhador brasileiro”.
- d) No corrente ano, as lideranças sindicais têm direcionado suas atenções para as discussões em torno da reposição das perdas salariais com o Governo e os empresários. Nesse particular, ainda não se observam grandes programações do MS para as comemorações do “Dia do Trabalho”.
- 1) Referente aos eventos programados para o dia 01 MAI 89, na CONTINUAÇÃO DO PEDIDO DE BUSCA NÚMERO 00028/140/APA/89. Capital e no interior do Estado, que sejam do conhecimento desse OI, solicita-se conhecimentos acerca das seguintes necessidades: – natureza do evento; – local e horário; – entidades e/ou pessoas promotoras. 2) Sobre os eventos realizados durante o “Dia do Trabalho”, solicita-se o atendimento das seguintes necessidades: – número de participantes; – identificação dos coordenadores e das lideranças sindicais, políticas, estudantis e populares presentes; – teor dos pronunciamentos e identificação de seus autores; – exemplares de material literário distribuído, se for o caso.
O DESTINATÁRIO É RESPONSÁVEL PELA MANUTENÇÃO DO SIGILO DESTE DOCUMENTO (Art. Número 12 – Dec. Número 79089,77 – Regulamento para Salvaguarda de Assuntos Sigilosos).”
“ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL BRIGADA MILITAR EMBM-PM2 – Fls 01/15. INFORME Número 308/31/89/PM2/BM/RS. DATA: 09MAI89. ASSUNTO: SEGUNDA ROMARIA DO TRABALHADOR – 1MAI89 – SAPIRANGA/RS. REFERÊNCIA PB Número 000228/140/APA/89. ORIGEM: EMBM- PM2. AVALIAÇÃO: 1. DIF. ANTERIOR: ***. DIFUSÃO: APA/SNI – E2/CNS – SCI/SSP/RS. ANEXOS: 04 fotografias do evento – impressos diversos coletados no local.
- Os romeiros que participaram da SEGUNDA ROMARIA ESTADUAL DO TRABALHADOR, em SAPIRANGA/RS, no dia Primeiro de Maio de 1989, das 1000 às 1700 horas, começaram a chegar à Praça Berlim, local da concentração, por volta das 0800 horas, oriundos de diversos municípios do interior do Estado, sendo recepcionados por componentes da Diocese local, devidamente identificados por crachás.
- À medida que o tempo passava, o número de romeiros ia aumentando sensivelmente, havendo, por volta das 0930 horas, aproximadamente 8.000 pessoas no local e cerca de 110 ônibus no estacionamento. Todos sob o comando dos organizadores do evento ensaiavam cantos (conforme anexo).” (Os documentos do SNI e da BM/RS estão transcritos na íntegra, ’ipsis literis’.)
Seguem 13 páginas com descrição das falas e relação de pessoas presentes, entre os quais: “36. Políticos presentes: JOSÉ FORTUNATTI, ADÃO PRETTO, SELVINO HECK, PAULO RENATO PAIM, ANTÔNIO MARANGON.” Segue, no relatório da BM/RS, a descrição do letreiro das faixas e cópia do panfleto convocatório: “O TRABALHADOR ORGANIZANDO A SUA LIBERTAÇÃO – PRIMEIRO DE MAIO 1989 – Fome, Doença, sem Teto –- Injustiça, Exploração, baixo Salário – SEGUNDA ROMARIA DO TRABALHADOR SAPIRANGA.”
A convocação do Primeiro de Maio/2020 está sendo feita nos grupos de Whats App e redes sociais: “PRIMEIRO DE MAIO UNIFICADO/2020 – SAÚDE, EMPREGO, RENDA, DEMOCRACIA – UM NOVO MUNDO É POSSÍVEL COM SOLIDARIEDADE – FIQUE EM CASA – Live a partir das 10h – CGTB, CTB, CUT, INTERSINDICAL Central da Classe Trabalhadora, CSP CONLUTAS, Central da Classe Trabalhadora, NCST Nova Central, FORÇA SINDICAL, INTERSINDICAL instrumento de Lula e Organização da Classe Trabalhadora, CSB Central dos Sindicatos Brasileiros, PÚBLICA CENTRAL DO SERVIDOR, UGT, FRENTE BRASIL POPULAR, FRENTE POVO SEM MEDO, Fórum pelos Direitos & Liberdades democráticas ”. (A transmissão virtual da manifestação acontecerá a partir das 9h30m de Primeiro de Maio/2020, pela Rede Soberania e retransmitida pelas Centrais Sindicais, Frentes e movimentos populares. LIVE: facebook.com/redesoberania. À noite, haverá um panelaço.)
Vale acentuar e assinalar.
As pautas de 1979, 1989, 2020 são as mesmas: salário justo, emprego, direitos, democracia.
Em 1979, havia uma Ditadura militar aberta. Mas as trabalhadoras e os trabalhadores estavam na luta e nas ruas. Em 1989, a redemocratização tinha acontecido, depois das Diretas Já, A Constituição Cidadã tinha sido proclamada, e havia previsão das primeiras eleições diretas para Presidente pós ditadura. No entanto, a espionagem, federal e estadual, estava a pleno vapor, talvez mais que em 1979. O povo, as trabalhadoras e os trabalhadores estavam nas ruas. Em 2020, há uma ditadura disfarçada, tutelada pelos militares. A espionagem, como vimos nas recentes mudanças no Ministério da Justiça e Polícia Federal, e nas manifestações populares dos últimos tempos, está a pleno vapor.
Desta vez, 2020, o coronavírus não permite ir para as ruas. As mortes estão aí por todos os lados. “E daí?”, pergunta o presidente fascista, sem alma e sem coração. Agora, a grande novidade é a mobilização via redes sociais, e os panelaços dia e noite, Brasil afora. As trabalhadoras e os trabalhadores continuam se manifestando no Primeiro de Maio e lutando por direitos. O povo resiste e defende a democracia.
A História não para. Nem a classe trabalhadora. Primeiro de Maio é dia de reafirmar que a luta continua, e de proclamar que a classe trabalhadora unida jamais será vencida.
(*) Deputado estadual constituinte do Rio Grande do Sul (1987-1990).