POR TIAGO BARBOSA
A decisão de deixar de cobrir o chiqueiro bolsonarista na saída do Palácio da Alvorada é, acima de tudo, o atestado de incompetência e cegueira jornalísticas da mídia tradicional brasileira.
O recuo sob ameaças de agressão física prova o equívoco cabal das análises feitas anos a fio sobre os riscos à democracia e à liberdade de imprensa – mesmo sob todos os alertas emitidos pelo campo e pela mídia progressistas.
É preciso enfatizar: Globo, Veja, Folha, Estadão, Band e companhia enganaram o país ao minimizar a ameaça contida no clã miliciano e embutida no ódio irracional ao PT.
Essas empresas cometeram estelionato jornalístico contra assinantes e telespectadores quando manipularam o silêncio e manejaram interesses políticos e comerciais em detrimento do dever de informar a sociedade.
Não se trata de pregar a futurologia como matéria-prima do jornalismo e arriscar previsões em terreno movediço, como em situações de catástrofes naturais ou sanitárias.
Não. O enredo, a narrativa e o movimento das peças políticas repetiam nitidamente a escalada autoritária vista em violências recentes contra o Estado, no Brasil e no mundo. Bastava o olhar histórico.
Mais grave: o engodo jornalístico se forjou no silêncio a vozes dissonantes de mídias alternativas, alicerçadas na defesa das bandeiras humanistas, das minorias, dos oprimidos e da democracia.
Jornalistas e veículos com larga trajetória avisaram, mas foram embalados sob o rótulo de “chapa-branca”, “militante” e “petista” para destruir o contraditório e consolidar o discurso único de ódio, ignorância e conjecturas incapazes de sobreviver à brisa do tempo.
Quais textos e reportagens do passado recente indicavam a inexorável degeneração social, política e econômica do Brasil atual sob a extrema-direita?
As análises de Paulo Nogueira, Luis Nassif, Paulo Moreira Leite, Paulo Henrique Amorim, Mino Carta e de outros expoentes do jornalismo progressista se mantêm de pé enquanto se esfarelam na irrealidade as bravatas de Veras, Dórias, Mirians e Mervais, marionetes verbais de um discurso patronal insustentável.
A suspensão da cobertura presidencial é o obituário de um jornalismo de ilusões.
Crente na força das próprias mentiras, capaz de envernizar como democrata um tirano assumido até levar um previsível coice da história, a reprise lacerdista do século 21.
A mídia tradicional deve um pedido de desculpas, à sociedade, pela falsificação da realidade e, aos colegas progressistas, pelo silenciamento deliberado, pela opção ideológica em detrimento da razão e do dever de informar para o bem público.
E não adianta se fantasiar de vítima e tentar faturar assinatura sob a bandeira da democracia – o ódio confrontado, só agora, é filho legítimo da trapaça jornalística criada e usada por ela para destruir a soberania popular.
É fazer autocrítica. Mudar. Ou balançar o rebento.