The New York Times diz que Bolsonaro ameaça dar golpe militar no Brasil. Por Nathalia Bignon

Atualizado em 10 de junho de 2020 às 19:29
Na primeira página do New York Times: ameaça de golpe

O New York Times estampou na capa de sua edição desta quarta-feira (10) a chamada para um artigo no qual alerta que “à medida que os escândalos aumentam”, o presidente Jair Bolsonaro avança em sua tentativa de impor um golpe militar no maior país sul-americano.

Assinado pelos jornalistas Simon Romero, Letícia Casado e Manuela Andréia, o texto aponta que ameaças acontecem enquanto os problemas sobre o líder brasileiro se acumulam, ao mesmo tempo em que as investigações sobre o mandatário, seus filhos e aliados avançam, o número de mortes pelo novo coronavírus cresce e os investidores fogem do país.

O artigo do maior jornal norte-americano afirma que longe de afastar a ideia de intervenção, Jair Bolsonaro parece clamar para que os militares entrem na briga em seu círculo mais próximo. “De fato, um dos filhos do presidente, um congressista que elogiou a ex-ditadura militar do país, disse que uma ruptura institucional semelhante era inevitável”, diz um trecho.“’Não é mais uma opinião sobre se, mas quando isso acontecerá’, disse recentemente o filho do presidente, Eduardo Bolsonaro, alertando sobre o que ele chamou de uma “ruptura” iminente no sistema democrático brasileiro”.

Para o jornal, o impasse traça um cerco sinistro para o Brasil, um país que impôs o fim do domínio militar nos anos 80 e construiu uma democracia próspera. Em duas décadas, o Brasil passou a representar a energia e a promessa do mundo em desenvolvimento, com uma economia em expansão e o direito a sediar uma Copa do Mundo e Olimpíadas”, diz adiante.
O jornal recorda que, desde então, a economia fracassou, escândalos de corrupção destruíram ou enlaçaram muitos de seus líderes e uma batalha de impeachment derrubou seu poderoso governo de esquerda.

Traçando a trajetória do presidente brasileiro, o NYT também firma que “Bolsonaro, um ex-capitão do Exército, entrou nesse tumulto comemorando o passado militar do país e prometendo restaurar a ordem”. “Mas ele [Bolsonaro] foi criticado por subestimar o vírus, sabotar medidas de isolamento e minimizar um dos mais altos números de mortes no mundo, dizendo: ‘Sentimos muito por todos os mortos, mas esse é o destino de todos’.

“Ele, sua família e seus apoiadores também estão sendo acusados em alegações como abuso de poder, corrupção e disseminação de fake news. No entanto, quase metade do seu gabinete é formado por militares”.

Depois de discorrer opiniões de pesquisadores e pessoas próximas, o diário também aponta que algumas autoridades da administração de Bolsonaro estão examinando ativamente os cenários em que os militares podem intervir.

“Um oficial militar do governo que não estava autorizado a falar publicamente disse que uma intervenção permaneceu fora do radar por enquanto, mas que certas medidas do judiciário, como solicitar uma busca no palácio de Bolsonaro como parte de uma investigação, poderia mudar isso”. O jornal também afirma que Bolsonaro está confiando na ameaça de intervenção militar para afastar os desafios impostos pela presidência.

Depois de relatar uma série de episódios que comprovam o andamento do plano do presidente, o jornal ainda cita Silas Malafaia como um evangélico de direita próximo ao presidente, “que insistiu que o próprio não havia lhe confidenciado nenhum plano de intervenção militar.

No entanto, o jornal conta que, “ainda assim”, Malafaia argumentou que as forças armadas tinham o direito de impedir que os tribunais ultrapassassem ou até derrubassem o presidente”. “Isso não é um golpe”, disse Malafaia. As autoridades pró-Bolsonaro que estão proferindo essas ameaças geralmente não se referem à maneira como os golpes são realizados na América Latina, com as forças armadas derrubando um líder civil para instalar um deles.

Relatando o andamento do processo sobre o pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, o diário americano repercutiu ainda a fala do deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), na qual ele afirma que “qualquer possível anulação da eleição de 2018 por um juiz também seria considerada inaceitável, porque removeria não apenas Bolsonaro, mas também seu companheiro de chapa e vice-presidente, Hamilton Mourão, general aposentado”.

O periódico também sublinha que Fernando Henrique Cardoso, um ex-presidente civil que foi exilado durante a ditadura militar, disse que não achava que um golpe fosse iminente. Mas ele teme que as táticas de intimidação de Bolsonaro possam se intensificar”.

“Como morrem as democracias? Você não precisa de um golpe militar”, disse Cardoso, 88 anos, que já pediu diante de repórteres a renúncia de Bolsonaro. “O próprio presidente pode buscar poderes extraordinários e usá-los”.