Pastores angolanos rompem com direção brasileira da Igreja Universal, acusada de desvio de dinheiro e até racismo

Atualizado em 24 de junho de 2020 às 14:35
Igreja Universal do Reino de Deus em Angola © IURD

Publicado originalmente no site RFI

POR LÍGIA ANJOS

Em um movimento sem precedentes, bispos e pastores angolanos da Igreja Universal do Reino de Deus anunciaram nesta terça-feira (23) uma ruptura com a liderança brasileira da instituição devido a “muitos crimes”, entre eles, racismo e desvio de dinheiro. Os religiosos angolanos invadiram dezenas de templos na capital Luanda e em outras cidades do país e divulgaram um manifesto contra a direção da instituição no Brasil.

Em entrevista exclusiva à RFI, o pastor angolano Silva Matias afirmou que a ruptura aconteceu porque “muitos crimes e muitas irregularidades têm sido cometidos pela liderança brasileira”. Entre as denúncias, Matias cita o racismo por parte dos membros da instituição no Brasil, entre eles, o bispo Edir Macedo, chefe da Igreja Universal.

“Em uma reunião fechada, uma conferência que ele fez conosco, ele disse que nós, pretos, temos essa aparência porque nossos ancestrais, nossas mães, quando concebiam, tinham muito contato com macacos. Isso foi uma tremenda aberração e uma autêntica falta de respeito, vindo dessa pessoa que é líder fundador da igreja”, afirma.

O pastor angolano também acusa o bispo brasileiro Honorilton Gonçalves, ex-vice-presidente da TV Record de racismo. “Sabemos que ele, um homem branco, trata os negros com desdém”, reitera.

Matias também refuta as declarações de Gonçalves, que afirmou que os angolanos que se rebelaram não são mais religiosos. “Nós não somos ‘ex-pastores’ porque a igreja foi tomada a nível nacional. De Cabinda a Cunene, as 18 províncias foram tomadas porque os pastores já não se vêem na gestão brasileira”, declarou à RFI.

Na segunda-feira (22), um grupo de religiosos de Angola tomou o controle de 35 templos da Igreja Universal do Reino de Deus em Luanda e cerca de 50 outras filiais da instituição em outras províncias do país, como Cabinda e Cunene. Matias afirma que os angolanos recusam “qualquer tipo de negociação” com a sede no Brasil.

Segundo ele, não há nenhuma possibilidade que os pastores e bispos angolanos reatem com a gestão brasileira. Os religiosos acusam a sede da Igreja Universal do Reino de Deus de desviar recursos para o exterior, discriminar funcionários locais e de promover a esterilização de sacerdotes africanos.

Segundo o grupo rebelado, a instituição passou a ser denominada de Igreja Universal de Angola. A liderança ficará a cargo do bispo Valente Bezerra Luiz, até então vice-presidente da igreja no país. Os angolanos afirmam ter o controle de 42% dos templos.

Práticas “criminosas”

Em comunicado publicado no Facebook, a Igreja Universal do Reino de Deus afirma que foi invadida em algumas localidades por “ex-pastores desvinculados da instituição por práticas e desvio de condutas morais e em alguns casos criminosas contrárias aos princípios cristãos”. O documento classifica a atitude dos religiosos angolanos de “práticas criminosas”.

Segundo a nota, os bispos e pastores rebelados foram “tomados por um sentimento de ódio” e realizaram “ataques xenófobos”. “Agrediram e feriram pastores, esposas de pastores e funcionários, usando a violência com objetivo de tomar de assalto a igreja com propósitos escusos”, afirma o comunicado.

A nota também apela a “comunidades competentes” para que resolvam o problema. Segundo o post, a Igreja Universal do Reino Deus está oficialmente em Angola desde 1992, e conta atualmente com 512 pastores: 419 Angolanos, 65 Brasileiros, 24 Moçambicanos e 4 São-tomenses.