Ao contestar vacina, Átila Iamarino mostra que o negativismo dele é quase tão nocivo quanto o negacionismo de Bolsonaro

Atualizado em 1 de agosto de 2020 às 7:31
Átila Iamarino, cientista do programa Nerdologia. Foto: Reprodução/Instagram

Por Joaquim de Carvalho

O divulgador científico Átila Iamarino explodiu nas redes sociais ao divulgar um estudo do Imperial College, do Reino Unido, segundo o qual o Brasil teria 1,1 milhão de mortos com a pandemia até agosto.

Depois ele disse que vacinas não estariam disponíveis antes de dois anos, considerando o histórico de produção dos laboratórios.

Em função dos primeiros resultados positivos, o divulgador científico afirmou também que criar vacina não era difícil. A complicação seria a garantia da segurança.

Agora, Átila Iamarino diz que as vacinas que estarão disponíveis já a partir de agosto — muito antes da sua previsão — não atenderão toda a população antes de quatro ou cinco anos, considerando o ritmo de produção dos laboratórios.

Destaca também que os que forem imunizados agora já estarão vulneráveis ao coronavírus quando o ciclo de vacinação planetária terminar, daqui a quatro ou cinco anos.

Ou seja, levando a sério o que diz Átila Iamarino, se ficar o bico come, se correr o bicho pega.

É nítido que Átila Iamarino está exagerando. Seguem os tuítes dele de hoje — na sequência, os comentários:

“Teste com a vacina de Oxford em porcos e ratos mostrou que 2 doses produzem uma resposta imune bem melhor. Se a da BioNTech/Pfizer fizer o mesmo, 1,3 bi doses até 2021 protegem só 650M pessoas. EUA e UK compraram volumes pra 2 doses por hab”, escreveu.

“Apontei EUA/UK só pra dizer que acreditam que vai precisar de 2 doses. E pagaram por isso. Aí precisaremos de 14bi de doses pro mundo. Mesmo escalando a produção pra inéditos 3-5bi por ano, vai tempo até todo mundo estar protegido”, acrescentou.

“E levando 3-5 anos pra vacinar todo mundo, se a imunidade cair – é o precedente que temos de coronavírus de resfriados – quando os últimos estiverem sendo vacinados, os primeiros já estão vulneráveis de novo…”, finalizou.

“Estamos ferrados, né, minha filha?”, diria o médico Dráuzio Varella.

Mas será?

É hora de confrontar Átila Iamarino, elevado à condição de celebridade com as notícias mais negativas sobre a pandemia.

Ao criticá-lo, não se tratar de negar a gravidade do coronavírus, registre-se.

Mas ressaltar o que até um leigo sabe: notícias catastróficas atraem muito mais a atenção.

Orson Welles era ator quando apresentou na rádio Colúmbia o texto do livro Guerra dos Mundos como se fosse um boletim sobre uma fictícia invasão de marcianos.

Há relatos de que houve pânico nos Estados Unidos, o que é contestado.

Mas, sem dúvida, houve muita audiência, e Orson Welles ficou ainda mais famoso.

Átila, certamente, não está mentindo ao apresentar sua análise negativa sobre o coronavírus. Mas sua abordagem, sem dúvida, atrai muito mais a atenção.

E é fato que ele tem errado.

Não houve — nem haverá — 1,1 milhão de mortos até agosto, como era a previsão do Imperial College, a vacina está surgindo muito antes. E, ao que parece, com segurança.

Dráuzio Varella, que é o tipico médico que tem a expressão de quem sempre tem o remédio para os piores males, diria:

“Fica tranquila, minha filha. A vacina está chegando e vai aliviar o seu sofrimento e aplacar a sua ansiedade”.

O negativismo de Átila Iamarino é nocivo (sobretudo porque ele tem errado), talvez nem tanto quanto o negacionismo de Bolsonaro e seus seguidores.

Está na hora de vê-lo também como um youtuber (ofício que escolheu muito antes da pandemia) e não divulgador científico ou cientistas. E youtuber, como todos sabemos, está sempre em busca de audiência.