Por Joaquim de Carvalho
A maior dificuldade que a defesa de Lula enfrenta nos tribunais simpáticos à Lava Jato é a ausência de um critério que dê aos advogados o mesmo direito que os procuradores têm.
A ausência daquilo que, no meio jurídico, é chamado de “paridade de armas”.
Isto é, se a acusação, representada pelo Ministério Público, pode usar metaforicamente uma pistola, os advogados não podem se defender com uma faca.
É um duelo desigual.
No caso dos arquivos da Odebrecht, por exemplo, a força-tarefa em Curitiba pôde analisá-los livremente. Já a defesa, não. Ela tem que indicar o que deseja ver e a Justiça fornece cópias.
O acesso irrestrito é importante para demonstrar que, ao contrário do que consta nas duas sentenças que condenaram Lula em Curitiba, nunca houve um caixa geral de propina nem uma conta destinada a atender Lula.
Esta é uma lenda que jornalistas como Diogo Mainardi, do Antagonista, ajudaram a difundir.
Mas a defesa não consegue fazer essa prova de inocência — expressão absurda que, com a Lava Jato, passou a ser corrente no vocabulário dos operadores do direito. Até um estagiário sabe que o ônus da prova cabe a quem acusa.
Agora, a defesa luta para ter acesso ao conteúdo das mensagens dos chats da Lava Jato que foram hackeadas e que são a base da série Vaza Jato.
O conteúdo foi apreendido pela Polícia Federal na Operação Spoofing.
“Mensagens da ‘Spoofing’ foram periciadas e um procurador da Lava Jato já pediu e teve acesso à parte do arquivo que indicou. A defesa deve ter o mesmo direito”, disse hoje o advogado Cristiano Zanin Martins.
A manifestação ocorre no mesmo dia em que o site The Intercept Brasil divulgou mensagens que revelam acesso privilegiado e informal da força-tarefa em Curitiba a investigações conduzidas pelo Ministério Público Federal em Brasília.
“A reportagem da Vaja Jato — sobre os acessos informais da Lava Jato a informações protegidas pelo sigilo — mostra a necessidade de o Estado que acusa também dar acesso às mensagens que estão na sua posse (Operação Spoofing) e que reforçam as ilegalidades que apontamos desde 2016”, comentou Zanin.
Mesmo lutando sem as mesmas armas que os procuradores da república, a defesa de Lula tem conseguido resultados expressivos na segunda turma do STF, principalmente porque é sabido que o lavajatismo que contamina setores do Judiciário.
Para Zanin, a reportagem de hoje da Vaza Jato revela o modus operandi da Lava Jato em Curitiba — que, em países civilizados, levariam à anulação do processo.
“Mais uma vez, a reportagem mostra que a Lava Jato atuava com base no ‘dá uma olhadinha aí’ para depois esquentar coisas que interessavam”, afirmou. “Ninguém pode ter acesso a dados com base no ‘dá uma olhadinha aí’. Se o MPF tem poder de investigação, segundo definiu o STF, tudo precisa estar documentado e formalizado – para que os acessos sejam sindicáveis”, acrescentou.
A informalidade caracteriza, em boa medida, toda operação Lava Jato, desde a tabelinha que os procuradores fazem Brasil afora até a colaboração com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
“Sempre tivemos a sensação de que os dados circulavam sem as formalidades e depois eram ‘lavados’. Isso agora está mais claro do que nunca”, disse.
É impossível dizer que existe julgamento justo na Lava Jato quando setores do Judiciário endossam atitudes abusivas.
O STF tem corrigido alguns excessos, mas ainda faltam duas decisões para que o país retome o trilho do estado democrático de direito.
Um delas não depende do STF, é do Conselho Nacional do Ministério Público, que se reunirá no próximo dia 18 para decidir se afasta Deltan Dallagnol da coordenação da força-tarefa.
A outra cabe à segunda turma da corte suprema. É a anulação da sentença que condenou Lula, pela evidente parcialidade de Sergio Moro, o juiz que sempre fez política escondido atrás da toga.