O ano de 2019 terminou com boas notícias para o mercado de apostas esportivas no Brasil. Dentre as 20 equipes integrantes da Série A do Campeonato Brasileiro de Futebol, torneio organizado pela CBF, 13 contaram com uma empresa de casa de apostas em seu escopo de patrocinadores.
As marcas de betting e gambling ganharam força no Brasil após a Lei nº 13.756, de 2018, que flexibilizou a atuação das empresas e permitiu a inserção de propaganda camisas de times de futebol. O documento assinado pelo então presidente Michel Temer definiu parâmetros de atuação para o mercado de apostas esportivas, intitulado ‘apostas de quotas fixas’.
De lá para cá, as decisões para uma concreta regularização têm tramitado na Câmara dos Deputados, postergada de tempos em tempos. O objetivo era ter colocado a pauta para discussão ainda em 2019, mas foi atrasada para 2020, e novamente adiada com a pandemia de coronavírus.
A situação atual
De acordo com as normas atuais, o cidadão pode acessar um site de apostas online e fazer uso do serviço, seja para apostar em uma partida de futebol, seja para o Mundial de Fórmula 1, por exemplo. No ato da aposta, é necessário informar os valores de ganho ou de perda com os resultados.
O setor de jogos de azar também sofreu alterações ao longo dos anos. Por mais que não seja permitido abrir um estabelecimento para apostas desse tipo dentro do país, é possível jogar em cassinos online legalizados. Para preencher tal requisito, a empresa precisa ter sede fora do Brasil e operar no território de acordo com a regulamentação de suas bases.
A ‘briga’ atual de entidades e de políticos interessados no tema se concentra em uma devida regulamentação para a atuação de casas sediadas no Brasil, e até para a abertura de casinos legalizados. Para tal, foi criada a Parlamentar Mista pela aprovação do Marco Regulatório dos Jogos. Em discussão aberta ainda em 2019, um dos representantes da Frente, o deputado Bacelar, defendeu a pauta.
“Em um país onde não se gera emprego, com 14 milhões de desempregados, abrir mão de R$ 20 bilhões em impostos e 650 mil empregos não é uma atitude inteligente”, citou Bacelar em audiência pública na Comissão de Legislação Participativa da Câmara.
Cifras do mercado
De acordo com pesquisa da Zion Market Research, até 2024, o mercado de apostas esportivas movimentará cerca de US$ 155 bilhões anuais. Segundo a FGV, ao longo de 2018, o Brasil teve a circulação de R$ 4 bilhões em apostas esportivas legalizadas. Considerando as projeções do mercado ilegal, esses valores podem chegar a R$ 7 bilhões.
A lei assinada por Temer em 2018 prevê que 3% do montante das casas de apostas sejam destinadas aos clubes de futebol. Em um mercado futuro com a movimentação de R$ 10 bilhões anuais, R$ 300 milhões entrariam nos cofres dos times brasileiros, além dos patrocínios que já são firmados com as empresas do nicho.
Plataforma ‘galera.bet’ exibe patrocínio na camisa do Corinthians. Foto: divulgação Corinthians.
Nos Estados Unidos, segundo a Statista, o mercado de gambling (termo do inglês para os jogos de azar), traz uma contribuição anual superior aos US$ 100 bilhões, e emprega mais de 750 mil pessoas direta e indiretamente. A expectativa é que, caso regulamentada no Brasil, a atividade dos casinos gere empregos e movimente cifras altas em impostos.
Por que regulamentar?
Segundo o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA-RP), Bruno Auricchio Ledo, o Brasil já teria estrutura suficiente para permitir um mercado regularizado para as empresas de gambling. As fraudes ainda podem ocorrer, mas é possível montar um esquema de controle, como explica em publicação do Jornal da USP.
“No caso dos casinos, especialmente, é importante manter o registro dos vencedores de aposta acima de um determinado valor. Assim, você inibe que um mesmo vencedor ganhe muitas vezes em diferentes contextos, o que seria improvável, indicando uma fraude financeira, por exemplo, uma lavagem de dinheiro”, cita Bruno, que também explica o exemplo dos EUA.
“Olha como é a regulamentação em Las Vegas. Depois que o governo colocou regulamentação para os registros financeiros, diminuíram as fraudes e os casinos passaram a ser comprados por empreendedores”, finaliza Ledo.
O Projeto de Lei Suplementar 186/2014, de autoria do Senador Ciro Nogueira (PP/PI) traz uma série de definições e regulamentações para a exploração dos jogos de azar no país. Em entrevista à TV Senado, ainda em 2019, Ciro citou os principais motivos para defender a regularização dos casinos no país.
“O Brasil é um dos países que mais se aposta no mundo, tudo de forma ilegal. A sociedade, que poderia estar recebendo os frutos do lado bom do jogo, que é justamente emprego, renda e impostos, não recebe. Quem se beneficia do jogo no Brasil são pessoas que atuam na marginalidade”, explicou Ciro.
Por que não regulamentar?
A principal questão apontada contra a regulamentação dos jogos de azar se refere ao risco do vício na jogatina. Nesse sentido, o deputado Roberto de Lucena (PV-SP) lançou a Frente Parlamentar Mista por um Brasil sem Jogos de Azar. Na argumentação do político, o país ainda não teria estrutura para tal mercado.
“Estamos mobilizando e organizando o conjunto de parlamentares que pensam diferente ao projeto de legalização dos jogos de azar. Nós temos um custo que é social e esse custo social será pago por toda a sociedade! Vamos lutar contra esse projeto”, cita Lucena, em 2017.
O advogado Roberto Lasserre, em plenário público no ano de 2019, também argumentou sobre a questão do vício, principalmente em idosos.
“ A ludopatia é o vício em jogos de azar. Sabe quem mais atinge? As pessoas de terceira idade. As pessoas que estão ganhando hoje uma miséria na aposentadoria, e se fala tanto hoje de Reforma na Previdência. Essas pessoas que vão ganhar cada vez menos na sua aposentadoria, essas pessoas vão ter o seu dinheiro ainda mais retirado pelos jogos de azar”, citou Lassarre.
Expectativas para o futuro
O caminho para a regulamentação das apostas esportivas parece mais favorável às aprovações. Ainda no final de agosto de 2020, o presidente Jair Messias Bolsonaro assinou um decreto que permitiu às empresas privadas explorarem o mercado de loterias de quota fixa, denoniminação nacional para as apostas em modalidades esportivas.
Já o caminho para os casinos parece mais tortuoso. A PLS de Ciro Nogueira ainda tramita no Senado, junto de outras iniciativas para a área. Porém, as discussões sobre os jogos de azar podem ir longe. Alguns exemplos na América Latina podem ajudar o Brasil nas definições da regulamentação, como a Colômbia, que legalizou os jogos em 2016, e apenas no primeiro semestre de 2019, aponta ter arrecadado mais de USD 8 bilhões.