Publicado originalmente no Brasil de Fato:
Por Catarina Barbosa
Para além das dificuldades impostas pela pandemia do coronavírus, uma série de pessoas ficaram sem as suas casas, porque foram despejadas. O representante para América do Sul do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos, Jan Jarab se reuniu virtualmente com diversos movimentos sociais e representantes da sociedade civil para falar sobre o tema.
Os participantes discutiram sobre os despejos forçados que têm ocorrido em diversas regiões do Brasil durante a pandemia de COVID-19. As ações têm impactado negativamente vários assentamentos de trabalhadores sem terra e as comunidades quilombolas e indígenas.
A defensora de Direitos Humanos e do grupo organizador da reunião, Euzamara de Carvalho, afirma que houve um esforço conjunto das organizações para que o encontro fosse realizado.
“A reunião é o resultado de um esforço conjunto dessas organizações, com objetivo de colocar para ONU a gravidade das violações do direitos humanos dos povos que lutam pela terra e território, ocorridas no Brasil, de forma a solicitar posicionamento da ONU, frente a gravidade do aumento dos despejos forçados ocorridos neste período de pandemia”, diz ela.
Um dos exemplos de violação de direitos humanos é a ação de despejo do acampamento Quilombo Campo Grande, que concentrava 450 famílias sem-terra no município de Campo do Meio, localizado no sul de Minas Gerais. Os acampados vivem na área da usina falida Ariadnópolis, da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo (Capia), que encerrou as atividades em 1996.
As famílias que ocupam o terreno desde 1998 são referência na produção agroecológica. Os agricultores também desenvolvem atividades como plantio de cereais, milho, hortaliças e frutas.
Euzamara pontua ainda que “espera que a ONU acompanhe e dê seguimento ao dialogo junto as organizações da sociedade civil”.
O avanço do agronegócio
Durante a reunião, representantes dos movimentos sociais e da sociedade civil informaram a Jan Jarab que as ações de despejos são movidas por grandes empresas do agronegócio, fazendeiros, poder político local e outros atores.
Os relatos dão conta de atuações violentas das forças de segurança e destruição de moradias, escolas e espaços sagrados. Também foram discutidos temas como o aumento de conflitos rurais, a ausência de políticas de reforma agrária e a falta da proteção dos grupos vulneráveis, acentuada pela desestruturação dos órgãos que devem protegê-los.
Silvio Netto, da direção nacional do MST, que participou da reunião representando as comunidades Sem Terra, disse que “essa abertura que houve de sermos chamados a participar da reunião com o alto comissariado da ONU demonstra a legalidade e a legitimidade da luta pela terra, bem como a covardia explícita na ação de despejo. Não esqueceremos, seguiremos denunciando para que nunca mais volte acontecer.”
Para Jan Jarab, da ONU, “os despejos e a violência no campo têm sido uma preocupação constante do escritório regional, e essa reunião foi uma oportunidade de escutar experiências e relatos de pessoas que estão afetadas por despejos forçados”.
O representante declarou que o escritório seguirá apoiando os atores da sociedade civil e os titulares de direitos, compartilhando padrões internacionais e advogando direitamente com as autoridades.
Em agosto, o relator especial da Organização das Nações Unidades (ONU) para moradia, Balakrishnan Rajagopal, pediu explicações para o governo de Jair Bolsonaro sobre ação truculenta de policiais militares contra famílias do Quilombo Campo Grande. Eles chegaram a atear fogo nas áreas do acampamento.