Lava Jato usa conta imaginária e sentença de Moro para denunciar Lula pela 4ª vez em Curitiba

Atualizado em 14 de setembro de 2020 às 20:04

Publicado originalmente no GNN

O ex-presidente Lula – Fabrice Coffrini/AFP

Na mesma semana em que a Lava Jato do Rio de Janeiro transformou o advogado Cristiano Zanin em réu, o ex-presidente Lula virou alvo de mais uma denúncia feita pelo braço da operação em Curitiba. Na última sexta (11), a força-tarefa agora liderada pelo procurador da República Alessandro Oliveira decidiu criminalizar as doações oficiais feitas pela Odebrecht ao Instituto Lula.

A denúncia questiona a legalidade de R$ 4 milhões que a Odebrecht doou ao Instituto entre dezembro de 2013 e março de 2014, em quatro transações. Os recursos supostamente têm “origem ilícita” e estão conectados com contratos ou vantagens obtidas pela Odebrecht junto à Petrobras, resumiu a revista Veja nesta segunda (14).

Na narrativa criada pelos procuradores há alguns anos, quando Sergio Moro ainda era o juiz dos casos de Lula, empresas como Odebrecht e OAS teriam criado uma “conta corrente informal” ou um “caixa virtual” – nas palavras da defesa de Lula – para depositar propinas usadas para agradar ao PT. Os recursos da doação ao Instituto Lula, assim como a reforma do triplex e do sítio de Atibaia, supostamente saíram desse caixa.

A defesa de Lula já apontou inúmeras vezes que essa “conta corrente informal” é uma conta imaginária que existe apenas na boca de réus, como Léo Pinheiro, e delatores premiados, como Marcelo Odebrecht.

Na nova denúncia, mais uma vez as anotações em um papel (a famosa “planilha italiano”) feitas por Marcelo Odebrecht são usadas para provar a “existência” dessa conta corrente.

Diferentemente do que ocorreu com outros réus e investigados – caso de José Serra, mas na Lava Jato em São Paulo – a força-tarefa em Curitiba, em seus seis anos, jamais apontou o número de uma conta bancária real ou o nome de uma offshore que pertencesse a Lula ou que fosse associada a ele.

Veja divulgou um trecho atribuído à acusação do MPF que mostra que a base para esta quarta acusação contra Lula são as delações sobre o caixa imaginário e sentença já proferida contra o ex-presidente.

Em nota, a defesa de Lula se diz “surpreendida por mais uma denúncia feita pela Lava Jato de Curitiba sem qualquer materialidade e em clara prática de lawfare.”

“Tais doações, que a Lava Jato afirma que foram “dissimuladas”, estão devidamente documentadas por meio recibos emitidos pelo Instituto Lula — que não se confunde com a pessoa do ex-presidente — e foram devidamente contabilizadas”, explicam.

Além disso, “o mesmo tema tratado na nova denúncia já é objeto de outra ação penal aberta pela mesma Lava Jato de Curitiba contra Lula, que foi recentemente sobrestada por decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, acolhendo pedido da defesa do ex-presidente.”

Antonio Palocci também foi denunciado nesta ação. Recentemente, a Polícia Federal apontou que a delação de Palocci é imprestável do ponto de vista probatório.

A Odebrecht também fez doações do Instituto Fernando Henrique Cardoso, que não foi “melindrado” pela operação.

Lula é alvo de outras três ações penais em Curitiba. Outros quatro processos instaurados contra o petista, em decorrência da Lava Jato, foram arquivados por falta de provas.

Leia a nota da defesa abaixo:

Nota da Defesa do ex-Presidente Lula

A defesa do ex-presidente Lula foi surpreendida por mais uma denúncia feita pela Lava Jato de Curitiba sem qualquer materialidade e em clara prática de lawfare. A peça, também subscrita pelos procuradores que recentemente tiveram suas condutas em relação a Lula analisadas pelo CNMP após 42 adiamentos — e foram beneficiados pela prescrição —, busca criminalizar 4 doações lícitas feitas pela empresa Odebrecht ao Instituto Lula entre 2013 e 2014. Tais doações, que a Lava Jato afirma que foram “dissimuladas”, estão devidamente documentadas por meio recibos emitidos pelo Instituto Lula — que não se confunde com a pessoa do ex-presidente — e foram devidamente contabilizadas.

A Lava Jato mais uma vez recorre a acusações sem materialidade contra seus adversários, no momento em que a ilegalidade de seus métodos em relação a Lula foi reconhecida recentemente em pelo menos 3 julgamentos realizados pelo Supremo Tribunal Federal. No caso do uso da delação de Palocci em processos contra Lula às vésperas das eleições presidenciais de 2018, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, também identificou possível motivação política do ato, além da própria ilegalidade. Para além disso, o mesmo tema tratado na nova denúncia já é objeto de outra ação penal aberta pela mesma Lava Jato de Curitiba contra Lula, que foi recentemente sobrestada por decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, acolhendo pedido da defesa do ex-presidente.

O excesso de acusações frívolas (overcharging) e a repetição de acusações são táticas de lawfare, com o objetivo de reter o inimigo em uma rede de imputações, objetivando retirar o seu tempo e macular sua reputação.

A denúncia acusa Lula e outras pessoas pela prática de lavagem de dinheiro, partindo da premissa de que o ex-presidente integraria uma organização criminosa. No entanto, Lula já foi absolvido de tal acusação pela 12ª. Vara Federal de Brasília, por meio de decisão que se tornou definitiva (transitada em julgado) e que apontou fins políticos na formulação da imputação. Nos contratos da Petrobras referidos na denúncia não há qualquer ato praticado por Lula (ato de ofício), assim como não há qualquer conduta imputada ao ex-presidente que tenha sido definida no tempo e no espaço, mesmo após 5 anos de investigação.

Essa nova investida da Lava Jato contra Lula reforça a necessidade de ser reconhecida a suspeição dos procuradores de Curitiba em relação ao ex-presidente, que está pendente de análise no Supremo Tribunal Federal, assim como a necessidade de ser retomado o julgamento da suspeição do ex-juiz Sergio Moro — a fim de que os processos abertos pela Lava Jato de Curitiba em relação a Lula sejam anulados.

Cristiano Zanin Martins